quarta-feira, 24 de abril de 2024

"Saudação a Walt Whitman" (Variante) - Fernando Pessoa


 


Saudação a Walt Whitman

 

 



Saúdo-te e chamo


A tomar parte em mim na saudação que te faço


Tudo quanto cantaste ou desejaste cantar.


Ervas, árvores, flores, a natureza dos campos...


Homens, lutas, tratados — a natureza das almas...


Os artifícios, que dão sabor ao que não é artifício


As coisas naturais que valem sem valor dado,


As profissões com que o homem se interessa por ter vontade


As grandes ambições, as grandes raivas, as pálpebras


Descidas sobre a inutilidade metafísica de viver...


Chamo a mim, para os levar até ti,


Como a mãe chama a criança para a sentir ser


A totalidade dispersa do que interessa ao mundo...


Ah, que nada me fique de fora das algibeiras


Quando vou procurar-te.


Que nada me esqueça, se te saúdo, que nada


Falte, nem o faltar esqueça,


Porque faltar é uma coisa — faltar.




Vá! Vá! Tudo! O natural e o humano!


Vá, o que parte! vá, o que fica! vá o que lembra e o que esquece!


Tu tens direito a ser saudado por tudo


E eu, porque o vejo,


Tenho o direito a encanar a voz em tudo saudar-te



 

Fernando Pessoa



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