Chico, Gil, Caetano e Djavan: de censurados a censores
De Roberto Carlos não se podia esperar outra coisa.
Afinal, passou a carreira toda sem dar um pio contra a ditadura e viveu os
últimos 50 anos como um verdadeiro monarca, decidindo tudo que podia ou não ser
dito sobre ele (não é à toa que é chamado de “Rei”, enquanto Xuxa, outra figura
pública que ainda acredita viver na Monarquia, é a “Rainha”).
Mas Chico Buarque? Um dos compositores mais
censurados do país? Gil e Caetano, exilados pelos militares? Gil, o ministro do
Creative Commons? Absolutamente surreal.
Na coluna de Ancelmo Gois no jornal “O Globo” de
sexta, Djavan justificou assim sua decisão:
“A liberdade de expressão, sob
qualquer circunstância, precisa ser preservada. Ponto. No entanto, sobre tais
biografias, do modo como é hoje, ela, a liberdade de expressão, corre o risco
de acolher uma injustiça, à medida em que privilegia o mercado em detrimento do
indivíduo; editores e biógrafos ganham fortunas enquanto aos biografados resta
o ônus do sofrimento e da indignação. Nos países desenvolvidos, você pode abrir
um processo. No Brasil também, com uma enorme diferença: nós não somos um país
desenvolvido.
Brilhante. Quer dizer que, enquanto não formos um
“país desenvolvido”, o melhor é recorrer à censura típica das repúblicas das
bananas?
O parágrafo de Djavan é tão confuso quanto algumas
de suas letras. Ele começa dizendo que é necessário preservar a liberdade de
expressão “sob qualquer circunstância”, para logo depois justificar a censura
sobre “tais biografias”.
Que biografias seriam essas? As que Djavan e amigos
não aprovam?
Depois, o compositor diz que editores e biógrafos
ganham “fortunas”. Não sei em que país Djavan vive. Onde eu vivo, se um autor
vende dez mil cópias, sai dando cambalhota de felicidade (o escritor ganha, em
média, 10% do preço de capa, então faça as contas e verá que escrever no
Brasil, com raras exceções, é coisa de maluco ou diletante).
Vivo num país onde o Luis Fernando Veríssimo diz
que não sobrevive de literatura. O Veríssimo.
E não adianta Djavan e turma dizerem que não se
trata de censura. Claro que é. Só é disfarçada de preocupação de mercado.
Em setembro, durante a Bienal do livro, Ruy Castro
leu um manifesto, assinado por 47 nomes, incluindo o historiador Bóris Fausto,
o escritor Cristovao Tezza, o poeta Ferreira Gullar, o cineasta Nelson Pereira
dos Santos e o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony, contra a suspensão da
tramitação do projeto de lei que libera a publicação de biografias sem
autorização dos retratados (leia aqui).
Um dos trechos do manifesto diz:
“A dispensa do consentimento prévio
do biografado não confere ao autor imunidade sobre as consequências do que
escrever. Em casos de abuso de direito, uso de informação falsa e ofensiva à
honra, a lei já contém os mecanismos inibidores e as punições adequadas à
proteção dos direitos da personalidade”.
Ninguém é a favor de biografias mentirosas. Um
autor que publica uma calúnia ou informação falsa deve ser punido. Mas também
ninguém pode ser a favor de um mercado de livros “chapa branca”, como os ícones
da MPB querem criar.
Andre Barcinski
3 comentários:
Também achei que estava delirando.
Em relação a Roberto Carlos para mim não é desilusão,
mas em relação aos outros é.
Em relação aos outros e principalmente ao Chico Buarque, desiludiram-me profundamente,
Como é possível exilados Gil e Caetano entrarem numa destas?
Gostava de ler mais comentários aqui.
Estou simplesmente a achar que estou delirando. Como é possível?
O comentario que aparece como anónimo é de Luís Proença, que por engaño não escreveu o nome.
Desculpem, mas a noticia deixou-me tão baralhado, que nem sei como apareci como anónimo.
Decepcionada com os ditos "reis" e "prícipes" da música popular brasileira!!!
Tive a oportunidade, através de um amigo muito querido, de ler a biografia do Roberto Carlos e achei descabida adecisão tomada por ele com relação ao lançamento da obra. Nada vi ali que poderia prejudicá-lo e fica a carteza: dinheiro no bolso dos outros é desinteressante!!! afffff
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