sexta-feira, 25 de março de 2022

"sobre guerra, paz e educação" - fernando rios e josé de sousa miguel lopes

 





sobre guerra, paz e educação



 

 

 

 

 

fernando rios e josé de sousa miguel lopes



 

 

 

 

 

panfleto manifesto pacifista. poema entrevista.



 

 

 

diálogo do jornalista fernando rios com o pedagogo



 

 

 

josé de sousa miguel lopes, professor doutor da



 

 

 

universidade do estado de minas gerais






temos que lembrar que os crimes de ódio são precedidos por discursos de ódio. [...]


todo genocídio começa com discurso de ódio. genocídio é um processo. o holocausto não começou com câmaras de gás. [...] palavras matam tanto quanto projéteis. [...] é preciso que sejam feitos todos os esforços para investir em educação e na juventude para que a próxima geração entenda a importância da vida em conjunto.



ADAMA DIENG


ADVOGADO SENEGALÊS, EX-CONSELHEIRO ESPECIAL DA ONU PARA A


 PREVENÇÃO


 DO GENOCÍDIO, EX-MEMBRO DO CONSELHO DO INSTITUTO


 INTERNACIONAL PARA


A DEMOCRACIA E ASSISTÊNCIA ELEITORAL E EX-SECRETÁRIO DO


 TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA RUANDA.



 

(...) que lugar dar à tecnologia em uma antropopedagogia contemporânea? como destaca heidegger, a técnica não tem nada de diabólica, ela revela, ao contrário, o mundo como produção.



eis o ponto-chave: não a tecnologia em si, mas a relação do homem com a tecnologia. hoje, é frequente uma relação inculta ou mágica. vivemos em um mundo humano tecnológico, é nesse tipo de mundo que a educação convida o jovem a entrar e me parece, portanto, importante que ele possa compreender os princípios básicos dos objetos tecnológicos que utiliza cotidianamente: smartphone, computador, televisão etc. não para acrescentar mais um capítulo ao ensino bancário, nem preparar para um mundo pós-humano, mas para ocupar com humanidade um mundo tecnológico.



ocupar o mundo com humanidade e se ocupar dele, com todas as formas de solidariedade que esse termo implica. esse deve ser, em minha opinião, o princípio básico de uma educação contemporânea. trata-se de educação e educação ao humano.  aprender é necessário, mas não suficiente. pode-se ter aprendido muitas coisas e alimentar as fogueiras da santa inquisição, fabricar a bomba de hiroshima, deixar imigrantes afogarem-se no mar mediterrâneo ou aderir a essas outras formas de barbárie que nos propõem o pós-humanismo. educar é educar ao humano. a barbárie, sejam quais forem suas formas, incluindo muito modernas, pensar fora do humano. educação ou barbárie, hoje é preciso escolher.



BERNARD CHARLOT


EDUCAÇÃO OU BARBÁRIE? UMA ESCOLHA PARA A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA. SÃO PAULO: CORTEZ, 2020, P. 304



 

 

 

fr



até agora, só se falou, se escreveu e se refletiu sobre a paz.


é hora de construí-la.


como um sólido edifício.


porém, antes de ser tarefa de todos,


deve ser tarefa de cada ser humano.


a paz precisa diariamente ser aprendida, ensinada e cultivada.



 

só a educação é forte e consistente para isso


para fazer uma revolução e mantê-la nos corações e mentes


nos corpos e nas almas


porque a paz precisa estar em tudo de cada um de nós

 

só a educação, mas não qualquer educação


pode construir e manter a paz



 

nazistas tinham escolas


e eles a consideram boas



 

de que educação estamos falando?



 

 

jsml


uma educação “em” paz e “para a” paz,


disposta a denunciar


a impugnar os riscos


inerentes à contínua presença da guerra no mundo,


agravada pela perversidade de suas estratégias


e a intensidade destrutiva


que armazenam os arsenais atômicos, químicos, biológicos


de que dispõem numerosos países.



 

há que gritar não à guerra,


a todas as guerras,


não em nosso nome,


não com nosso silêncio.


é preciso tomar posição pela paz.


não podemos virar as costas ao conflito.


não devemos ignorar as razões


que levaram à destruição de tantos inocentes.


que fazer?



 

debater os problemas da paz entre os professores.


a ética “na” e “da” profissão docente deve tomar partido.


debater este assunto nas aulas,


convidar os alunos a se expressarem,


organizar ações informativas,


manifestar publicamente nossa postura contra a guerra...


 

 

as instituições educativas


não podem permanecer à margem do sofrimento do mundo.



 

 

 

 

fr



em todos os tempos, nós os seres humanos


guerreamos por espaço, poder, comida



 

a guerra é um atavismo humano?


com ou sem poder, é o ser humano, ao mesmo tempo


subserviente, dominador, solidário?


senhor e escravo?


como?



 

ensinamos e aprendemos a fazer guerra


sem escolas, nem disciplinas, nem livros



 

e, com tantas escolas


quando aprenderemos


a ensinar, a cultivar, a conviver a paz?



 

mas por que a guerra?


por que ela nos fascina?


mas o que é a guerra?



 

jsml



a guerra é o ato mais sangrento passível de acontecer


por subordinar ao terrorismo dos que têm mais força


os inocentes que vão ao altar do sacrifício


os seres humanos não possuidores de outros bens


além dos seus próprios corpos


memória, ideais, família, princípios e objetivos de vida.


 

 

ainda que nos custe aceitá-lo


temos evidências de que por via da educação


se legitimaram e exaltaram as vantagens da guerra


enfatizando sua contribuição para o avanço da ciência


da tecnologia e, incrivelmente, até da democracia



 

mesmo assim, em nome da educação e a partir dela


se justificam muitos dos discursos que optaram por “vencer” recorrendo à força


antes que por “convencer”


fazendo uso da razão



 

recordemos, não sem constrangimento


a ânsia belicista que animou e anima


as crenças pedagógicas que sustentam seu discurso


e o que é ainda pior, suas práticas


através do dogmatismo, da xenofobia, do fundamentalismo


do imperialismo ou do radicalismo


em qualquer de suas manifestações.




 

fr



quem pode dizer não à guerra?



 

os donos da guerra ficam calados


os donos do poder ficam calados


os donos das máquinas mortíferas ficam calados


e os veículos de comunicação de massa


financiados pelos donos da guerra


pelos donos do poder


pelos donos das máquinas mortíferas


falam o quê?



 

e nós, famélicos da paz, teremos voz para ser ouvida?


por quem?


a quem dizer não?


como dizer não?


quem diz não à guerra?


quem ouve esse grito que sai de tantas gargantas


e chega a ouvido nenhum?


 

esse “não” é um grito em vão


sufocado na garganta


como tantos outros?




 

jsml



o “não à guerra” – que gritaram todos os povos do mundo


expressa-se na rebeldia individual e coletiva


que combate e condena a falta de razão


de um destino que conduz à morte, à dor, ao sofrimento


ao fracasso ecológico e humano.



 

um “não à guerra” é um “não” ético


e, por isso, pedagógico



 

um “não” que deve ensinar-se como direito e responsabilidade


como sentimento e atitude


ante o que é sempre possível e desejável


deter na mente dos homens


nas decisões dos governos.




 

 

fr



o que sabemos nós da paz?


alguém faz propaganda da paz?


alguém diz que paz é alegria?


que paz é felicidade?



 

alguém diz que não encontramos a paz


surgindo na pia da cozinha


nem na manteiga margarina do pão da manhã


nem em qualquer comida para começar o dia


ou saciar a fome?



 

não há paz no mercado financeiro


muito menos


no investimento que dá dinheiro sem criar trabalhar



 

mas a paz pode estar no café da manhã,


no almoço, na janta


quando todos a tiverem



 

mas onde está a paz?


e por que precisamos procurar tanto?


ela está tão longe e tão perto que não pode ser vista?




 

jsml



entre a paz e a guerra existe um abismo


sabem-no os povos por experiência própria e alheia


por intuição


todos sabemos que não existem razões que o desmintam


assumindo inclusivamente


que praticamente todas as sociedades humanas


transitaram com facilidade entre uma e outra


da paz à guerra e desta àquela



 

às vezes, parecia que “juntas” ou em oposição


exigindo ou justificando a luta


como condição prévia para o estabelecimento de qualquer trégua


o combate como uma forma de procurar a concórdia


o ataque como uma estratégia que torne boa a defesa


a ameaça da guerra como garantia de uma paz duradoura...


e, sem dúvida, o abismo existe


tem existido sempre








 


fr



desde nosso início temos sido


homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


estranhos animais investidos de humanidade


e sempre envergonhando nossa espécie



 

todo animal é suficientemente agressivo


e violento para sobreviver


mas só o homem ser humano


sem a sua animalidade


na sua impiedosa maneira de ser humano


é agressivo, violento


e no lado mau da sua humanidade


acrescenta a crueldade


planeja seu fazer sofrer e o concretiza


assistindo com prazer o horror da dor e o desfalecer do outro



 

afia suas unhas para rasgar melhor a carne do outro


afia seus dentes para estraçalhar o corpo do outro


cria aves armas que sobrevoam corpos e cidades


e transformam tudo em escombros e postas de carne humana



 

humanamente


homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


reunidos em frios ambientes assépticos


solenemente, tristemente decorados


discutem o que fazer no meio da guerra


sem qualquer vontade verdadeira de interrompê-la



 

humanamente


homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


consultam a bolsa de valores de nova iorque e sorriem


consultam a bolsa de valores de londres e sorriem


consultam suas contas bancárias e sorriem


os donos da guerra sorriem


e, por vezes, gargalham



 

e humanamente


convocam jovens idealistas,


incautos cordeiros pacifistas


os recrutam e os transformam em violentos e agressivos gladiadores


para que façam mal sem olhar a quem



 

e são obrigados a defenderem suas vidas e encararem a morte


em nome da pérfida humanidade


dos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios



 

e os pacíficos cordeiros


agora violentos gladiadores na arena da guerra


enfrentam-se


e matam e se matam e morrem e se morrem


no lugar dos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


que se reúnem em salões refrigerados


e continuam sorrindo e gargalhando


enquanto ouvem os preços de suas empresas cadafalsos


explodirem nas bolsas valores



 

e compram comida e bebida


para comemorar seus cordeiros imolados


por suas mortíferas empresas cadafalsos


e suas destruidoras aves armas



 

quantas empresas mortíferas enterraram quantos corpos?


quantas empresas mortíferas soterraram cidades e corpos?



 

quanto as empresas cadafalsos mortíferas pagam


para seus homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios?



 

quantos eles saúdam a nova paz ensanguentada,


os corpos insepultos,


os corpos mutilados


os cemitérios abarrotados,


as cidades em escombros?



 

quem venceu a guerra?



 

wall street, londres, as bolsas de valores


as empresas cadafalsos mortíferas


os donos da guerra? Os donos do poder?



 

e o que fazemos nós paupérrimos proprietários e acionistas da paz


em que bolsa depositamos nossos valores?



 

a paz não é negociada nas bolsas de valores


ela está apenas na felicidade dos seres humanos


e felicidade não se compra nem se vende


felicidade se aprende e pode crescer no dia a dia



 

ninguém faz propaganda da paz


com a mesma força que aposta no consumismo



 

onde estão as agências de publicidade da paz?



 

paz e felicidade não engordam o capital


controlado pelos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios



 

onde estamos, em que beira de abismo?


estamos vendo o precipício?




 

jsml



na realidade,


trata-se de um abismo que adota as formas de um precipício


que nos coloca ante um vazio ético e moral sem retorno


do qual se faz parte e ao qual se chega por diversos caminhos



 

também através da educação



 

e, sem dúvida, também pela carência da boa educação


ou pelas desiguais oportunidades que oferece


a quem está de um ou de outro lado das fronteiras:


na riqueza ou na pobreza,


no norte ou no sul


na liberdade ou na opressão,


dentro ou fora...



 

sem a boa educação,


o abismo que existe entre a paz e a guerra se amplia


revelando os persistentes triunfos da barbárie


perpetuando a sedução da indolência e da ignorância


com todas as suas misérias


aumentando a injustiça e a exclusão


marginalizando homens e mulheres


no seu direito a construir um futuro


que lhes permita serem melhores


negando a convivência


ou limitando-a


a extremos que conduzem ao desespero e à humilhação



 

há que se cultivar a boa educação




 

fr



mas a boa educação tem voz?


quando a boa educação fala, quem escuta?



 

a boa educação pode responder?


quem é o dono da morte?


quem é o dono da vida?


quem são os donos da guerra


onde gravitam morte e vida?



 

com um pouco de sorte a bala atinge ao lado


com um pouco de sorte a bala não vira moral ferida



 

quem puxa o gatilho obedece a que?


quem dispara a bazuca obedece a quem?


e matam e morrem e morrem e matam


a serviço de quê?


a serviço de quem?



 

escolha um lado e caia no precipício


escolha um lado e cave sua cova


ninguém tem obrigação de cumprir sentenças de morte


que obrigação faz sentido sem fazer continência?



 

que ciência nos abre o abismo?


que ciência nos joga no precipício?



 

quem nos ajuda a encontrar a consciência?




 

jsml



é uma obrigação cidadã assumir uma postura,


e uma exigência


de a ética civil ficar ao lado


não daqueles que dizem fazer a história


mas daqueles que a sofrem



 

para isso, existe a boa educação


uma educação que não oculte o conflito


nem as divisões que ocorrem nas sociedades modernas


uma educação que não encubra os maus tratos


a crianças, mulheres, negros, velhos


homossexuais, refugiados, imigrantes etc. etc. etc.



 

que não oculte a violência, a agressão, os desequilíbrios,


as vítimas de cada uma das guerras


já travadas e por travar...


no dia a dia de cada um


no mundo de cada todos



 

uma educação “em” paz e “para a” paz


disposta a denunciar a impugnar


os riscos inerentes à contínua presença da guerra no mundo


agravada pela perversidade de suas estratégias


e a intensidade destrutiva


armazenada os arsenais atômicos, químicos, biológicos...


de que dispõem numerosos países




 

 

fr



que história é essa que se repete?


quem é esse vilão que se fantasia de herói


e que realiza seu desejo


transformando jovens infantes


em alvos de bazucas


em bucha de canhão


em alvos de miras telescópicas


com sempre a mesma desculpa


“se vis pacem, para bellum”?



 

quanta arma é preciso


para evitar a guerra?



 

mas se as armas feras estão prontas


o que fazer com elas?




 

jsml



há que se entender e compreender


que o conceito de guerra preventiva


é uma perversão do direito.



 

há que deixar bem claro


que qualquer guerra não só converte em vítimas


aqueles a quem mata, fere ou empobrece



 

são vítimas da guerra os agressores porque se aviltam


se enchem de ignomínia e de brutalidade


e também são vítimas as testemunhas


que aprendem terror, violência e mentira



 

as guerras são sempre declaradas pelos poderosos


e as sofrem os débeis



 

se um país perda a guerra, ganham os ricos


se um país ganha a guerra, perdem seus pobres




 

fr



quem são os homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


que em seus luxuosos infernos


tomam café da manhã, almoçam, jantam


e encontram demoniacamente seus iguais?



 

nos campos de batalha,


jovens cordeiros se engalfinham


não lutam com unhas e dentes


como nossos antepassados



 

agora carregam aves armas,


dirigem tanques históricos


em consciências pré-históricas


cavalgam indomados mortíferos bombardeiros


e matam e morrem e morrem e matam



 

e os homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


nem recolhem os corpos


preferem servir o banquete aos abutres...



 

que ações estão subindo nas bolsas de valores?


quanto o capital faturou


e rendeu homenagem ao deus dinheiro?


deus, deus dinheiro?


não, demônio,


demônio dinheiro, vampiro dinheiro, diabo dinheiro!


irmãos do pandemônio, pai da pandemia



 

juntos, capital, demônios do dinheiro, pandemônio da pandemia


dançam sobre seus lucros


e sobre os corpos de jovens cordeiros gladiadores



 

cui bono, cui prodest, quid prodest


a quem interessa?



 

quousque tandem?


até quando?






 


jsml



não se pode ignorar


que existem interesses econômicos


(venda de armas, negócios com o petróleo,


benefícios decorrentes da reconstrução...),


interesses geoestratégicos


(domínio da região, imposição do poder...),


eurização frente à hegemonia do dólar...




 

fr



neste chão coberto de sangue


nestes corpos cobertos de chão


quantos sabem o valor da vida


que acaba num piscar de olhos


quando a bala parte


quando a bomba explode?



 

quando a ave bala escolhe um bom ninho/corpo


e elas são tantas aves/balas e tantos os ninhos/corpos


e são tantas as aves/bombas, e tantas as cidades/ninhos



 

os humanos perderam suas vozes?


onde estão as palavras que pacificam


além dos dicionários?




 

jsml



a diplomacia fracassou


porque havia interesse em desencadear um conflito armado


que mostrasse claramente ao mundo quem é que manda.



 

 

fr



quem manda e desmanda e põe as aves armas para dormir?


dormindo, as armas aves são apenas ameaças


acordadas, não há acalanto que as faça dormir


e elas clamam, gritam, voam


e onde caem


deixam destruição, horrores, corpos sob os escombros,


escombros sobre corpos


e os donos da guerra comemoram abrindo champanhes


enchendo suas taças e se inebriam


e se embriagam vampirescamente



 

wall street e londres recolhem seus dinheiros



 

homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


assinam papeis, dão ordens, se confraternizam


se embriagam com seus lucros


nos seus infernos particulares


enquanto cordeiros caminham para o confronto cadafalso



 

cordeiros transformados em gladiadores


matam e morrem e morrem e matam,



 

não há melhor pasto para os deuses da guerra


nem para os demônios do dinheiro


nem os pandemônios do capital



 

e o que fazemos donos do poder?


Quem manda nos donos do poder?




 

jsml



como é possível que quem governe


nos tenha conduzido a uma guerra,


quando milhões de cidadãos


gritaram milhares de vezes que não a queriam?




 

fr



quem tem razão quando, olho no olho, dispara o gatilho


quem tem razão quando, olho no olho


vale mais o míssil ou fuzil


que transforma tudo em fóssil?



 

quem tem razão quando, olho no olho, a palavra engasga


e a fúria, o medo, a ignorância detonam a espoleta


e corpo e paisagem se fundem sem qualquer respeito?



 

e quem ensinou que deve ser assim para os jovens cordeiros?


o triste começo de um fim que não conta juventude


nem lições que falam de paz e amor, de solidariedade, amizade



 

agora são garras, unhas e dentes prontos para o dilaceramento


defender o quê, além da própria vida?


a vida dos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios?


a mortífera indústria armamentista?


os ávidos pandemônios capitalistas?



 

matar ou morrer, tanto faz


quem morre já não olha para trás


nem para frente


não cobra,


morto não vira semente


estatela-se no chão mesmo em solo fértil


uma desmemória num corpo inútil



 

quem vai recolher os gladiadores cordeiros raivosos


devidamente sacrificados


cuidadosamente ensinados


a manipular tanques, bazucas, fuzis, bombardeiros?



 

em que escola eles ensinarão para o futuro a inútil lição da violência?


onde mostrar a força infernal


dos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


que alardeiam paz e amor


e colocam nas mãos dos cordeiros seus ódios e suas aves armas?



 

o tempo é breve para quem enfrenta armas de guerra


o tempo não existe para quem está na frente de batalha


não há desvio entre vida e morte, apenas quem tem sorte



 

cada corpo é um alvo, em cada corpo começa e termina um destino


 

essa tragédia anunciada é um drama que poderia ter sido evitado


 

quem manda na humanidade, quem estimula tamanha insanidade?


 

quem vai ensinar que viver


é mais importante do que a glória do herói morto


mais importante do que o heroísmo que tanto agrada


aos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios?


nos seus bunkers enfurnados


bebendo servindo brindando os incautos gladiadores cordeiros?



 

a guerra não acabou, mas já estão todos mortos


os que morreram e os que viveram



 

nessa lição que ninguém aprende


quem vai ensinar a paz?



 

o dono da guerra e seus capitais?


os donos da guerra e seus capatazes?



 

quem pode interromper essa má sina?




 

 

jsml



contra a sanha assassina


defendemos uma educação que reivindique a paz.


assim como nos agradam


os esforços que estimulam


o poder do diálogo e da negociação,


o valor da razão face à razão do “valor”.




 

fr



fortes ou fracos


os cordeiros foram devidamente imolados...



 

quantos mais precisarão serem sacrificados


para que vença um mínimo de razão?


não a razão do mais forte, ou do mais fraco


a razão que expulse


homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


de suas bolsas e de seus valores


e os coloquem, não diante de um mapa tabuleiro de xadrez


e os coloquem no campo de batalha



 

sabemos onde começa e termina a guerra



 

mas onde começa, onde se planta a paz


onde se cultiva?



 

a paz começa numa boa escola da vida


numa boa educação, em casa, na rua, na escola


sem armas, apenas com a fala de professores


de pais, parentes, e seus amores


que aprenderam, aprendem e ensinam a criar governantes


que respeitem jovens pacíficos cordeiros e suas vidas




 

jsml



a guerra,


dizia cooper-prichard no final do século xvi,


é o “inverno da civilização”.


hoje mais do que nunca,


quando nos assaltam as incertezas,


necessitamos da luz da primavera.



 

 

fr



costumamos ser banhados por alguma luz da primavera


talvez por isso, há esperança



 

há os homens pássaros que fazem música


e nos ensinam a voar


os homens castores que constroem moradias de belos sonhos


e ali podemos morar


os homens santos que pregam a paz


como audaz, nos ofereceu sua vida ghandi



 

ou os arquitetos ghandis


ou os homens arco-íris


os que que pintam


e os que se pintam


e vivem coloridamente


e alegremente nos convidam a conviver



 

há os homens térmitas que esculpem


e nos esculpem de saberes



 

há os homens peixes que navegam


e nos ensinam a navegar dentro e fora de nós



 

e existe a poesia, “a vida secreta de todas as artes”


como platão nos ensina



 

e é na poesia que depositamos esperanças


é sobre a poesia que precisamos fazer nossas andanças



 

é na ensinança da poesia


que os corações transbordam


não de sangue esparramado


mas de viver enluarado, ensolarado


que faz os olhos olharem e sentirem as flores de monet


ou chorarem junto com os desolados girassóis de van gogh


e faz os ouvidos levarem o corpo à erupção


sob acordes de bach, brahms e beethoven


e erigirem as catedrais submersas de debussy


ou os monumentos arranjos de mahler



 

ou na negra resplandecente filosofia de achile mbembe


ou no sorriso de madiba mandela


ou a música dos swazi/zulu


ou na alegria, na dança, nos cantos dos massais


ou nos tambores de olodum


ou nos tambores de guerra japoneses


transformados em tambores da paz?



 

tudo isso ensina a paz


tudo isso prega a paz


tudo isso vive a paz



 

e cada um de nós


tem uma paz para ensinar



 

e quando isso acontecer em cada pessoa


longe dos homens-diabos, homens-vampiros, homens-demônios


e suas máquinas mortíferas


longe do demoníaco capital


perto do sagrado trabalho compartilhado


poderemos experimentar a paz



 

é difícil, está longe


mas temos no dia a dia


a imensa vontade


de propor ao mundo


a alforria da guerra


a alegria da paz




 

 

_______________________________________

 



FERNANDO RIOS É JORNALISTA, ASSESSOR DE COMUNICAÇÃO CORPORATIVA INTEGRADA, ESPECIALIZADO EM RELAÇÕES COM A COMUNIDADE, GHOST WRITER, POETA E ARTISTA PLÁSTICO  

fernando_rios@outlook.com.br 




 

JOSÉ DE SOUSA MIGUEL LOPES É PHD EM HISTÓRIA E FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO PELA PUC-SP, PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS, COORGANIZADOR DA COLEÇÃO CINEMA, CULTURA E EDUCAÇÃO, EDITORA AUTÊNTICA. EDITA O BLOG NAVEGAÇÕES NAS FRONTEIRAS DO PENSAMENTO.


https://navegacoesnasfronteirasdopensamento.blogspot.com


miguel-lopes@uol.com.br 

 


Este poema foi publicado pelo site "A terra é redonda" e pode ser lido clicando aqui
Foi igualmente publicado no site "Ruído Manifesto" e pode ser lido clicando aqui

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