sábado, 25 de dezembro de 2021

"Sobre as ervas" - Eugénio de Andrade

 




Sobre as ervas

 

 



 

 

Respiras


como se pela garganta


deslizasse todo o azul de Espanha


a noite


a língua do vento


sem outras mãos


outros olhos


para beber no escuro


Deita-te


sobre o meu peito
inclina


         até ao chão


as frágeis


hastes da beleza.


As palavras


onde te escondes


altas


     passam


passam as águas


dóceis


do verão


É tempo


já as amoras sangram


é tempo ainda


abre-me as portas do teu corpo


ó meu amor


deixa-me entrar.


Já sobre ti


de aroma em aroma


os lábios todos


                           caem


nupciais ou mortais os corpos


são para penetrar


                         lenta


                         oh


                         lentamente.


As mãos


sobre a nuca


delicadas.


Sobre as ervas


o leite


espesso do silêncio.



 

 

 

 

Eugénio de Andrade



 

 

 



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