domingo, 24 de março de 2024

"Rua de Montarroio" - Manuel de Freitas



 

Rua de Montarroio




Não sei de que fugíamos.


Dizer que era da vida pareceria


demasiado lírico, demasiado verdadeiro


— e a vida raramente aproveita a um poema.



Seja como for, a cidade


predispunha-se, aceitava calmamente


pequenos gestos de ternura,


delírios de morte apenas.


Zé dos Ossos, Trianon — os nomes


que decorei, enquanto fugíamos


da calúnia dos vinte anos.



As tardes no jardim, um pouco lúgubres,


prenunciavam a costumeira subida:


jantávamos os dois por setecentos escudos,


mesmo ao lado da taberna que não tinha mesas.



Saía barato, o amor. Por não sabermos,


ainda, que teríamos de o pagar a vida inteira


com juros aziagos e versos de demora.



 

Manuel de Freitas




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