"Peregrino e hóspede sobre a terra" - Ruy Belo
Peregrino
e hóspede sobre a terra
Meu
único país é sempre onde estou bem
é
onde pago o bem com sofrimento
é
onde num momento tudo tenho
O
meu país agora são os mesmos campos verdes
que
no outono vi tristes e desolados
e
onde nem me pedem passaporte
pois
neles nasci e morro a cada instante
que
a paz não é palavra para mim
O
malmequer a erva o pessegueiro em flor
asseguram
o mínimo de dor indispensável
a
quem na felicidade que tivesse
veria
uma reforma e um insulto
A
vida recomeça e o sol brilha
a
tudo isto chamam primavera
mas
nada disto cabe numa só palavra
abstrata
quando tudo é tão concreto e vário
O
meu país são todos os amigos
que
conquisto e que perco a cada instante
Os
meus amigos são os mais recentes
os
dos demais países os que mal conheço e
tenho
de abandonar porque me vou embora
pois
eu nunca estou bem aonde estou
nem
mesmo estou sequer aonde estou
Eu
não sou muito grande nasci numa aldeia
mas
o país que tinha já de si pequeno
fizeram-no
pequeno para mim
os
donos das pessoas e das terras
os
vendilhões das almas no templo do mundo
Sou
donde estou e só sou português
por
ter em portugal olhado a luz pela primeira vez
Ruy Belo
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