sábado, 28 de agosto de 2021

"Escrito na terra" - Eugénio de Andrade


 


Escrito na terra




 

 

Da migração dos pássaros falaremos devagar


noutra ocasião




da cal espessa entornada na boca


dos poços


onde o silêncio apodrece.




Há uma razão para não rejeitarmos


tão cruel metáfora do sémen




descobrimos


nas altíssimas e lúcidas bagas de setembro


uma sabedoria próxima ainda das nascentes.




Era isto


onde uma só pedra queima os dedos.




Se queres um exemplo


pega neste mar estranho


olha-te nele


mas não te demores a contemplar


a branca quietude das violetas.




Vamos


         é noite agora é tempo


enquanto meus lábios brilham


de alguém morrer sobre o teu corpo.






Eugénio de Andrade




 

 

 

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