sábado, 27 de fevereiro de 2021

"Eu luminoso não sou" - José Saramago


 





Eu luminoso não sou

 



Eu luminoso não sou. Nem sei que haja


Um poço mais remoto, e habitado


De cegas criaturas, de histórias e assombros.


Se, no fundo poço, que é o mundo


Secreto e intratável das águas interiores,


Uma roda de céu ondulando se alarga,


Digamos que é o mar: como o rápido canto


Ou apenas o eco, desenha no vazio irrespirável


O movimento de asas. O musgo é um silêncio,


E as cobras-d’água dobram rugas no céu,


Enquanto, devagar, as aves se recolhem.




 

José Saramago


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