"O império português é talvez o mais flexível a gerir populações coloniais até ao século XVIII"
O historiador português Francisco Bethencourt, que publicou o
livro Racisms: from the
crusades to the twentieth century (Princeton
University Press), não é, definitivamente, um saudosista do luso-tropicalismo
do sociólogo e ensaísta brasileiro Gilberto Freyre. Não defende que o império
colonial português tenha sido menos racista do que impérios como o britânico.
O
seu livro, ao convocar um tema como o racismo e ao fazer uma história
comparativa, vai ao coração das sociedades coloniais e à gestão dessas
populações. Como é que se deve lidar com a intensa miscigenação no Brasil dos
portugueses com a população indígena e com os escravos africanos, consequência
de uma reduzida emigração de mulheres portuguesas logo desde o início da
colonização? Porque é que esta população de raça mista ganhou muito mais
privilégios sociais e políticos do que no império britânico? Porque é que na
América do Norte no século XIX a raça mista desapareceu das classificações
raciais e posteriormente passou a ser possível ser apenas branco ou preto? Por
que razão, ao contrário, no fim do período colonial no Brasil a nomenclatura
racial chegou a ter 150 categorias?
Esta conversa-entrevista
durou mais de três horas e começou depois de uma visita guiada pelo King’s
College de Londres, onde o historiador é regente da cátedra Charles Boxer.
Francisco Bethencourt partira essa manhã de Cambridge às 6h45, onde vive com a
família (a mulher, Ulinka Rublack, é professora de História na Universidade de
Cambridge, especialista em história da mulher, cultura visual e material do
Renascimento e na reforma protestante). Desde a estação de comboio a que chega
em Londres, costuma pedalar até ao King’s. A bicicleta aí está, guardada no seu
gabinete, por onde passamos a caminho de uma aula.
O historiador português,
autor de História das Inquisições, Portugal,
Espanha e Itália (Círculo
de Leitores, 1994), entrou para o King’s College em 2005, cerca de um ano
depois de sair do Centro Cultural da Gulbenkian em Paris, que dirigiu, onde
chegou vindo da direção da Biblioteca Nacional de Portugal.
Combinámos que assistiria a
uma aula no curso de História Mundial: Poder e Desigualdade ao meio-dia, antes
da entrevista. No King’s, Bethencourt ensina, pela primeira vez, o que
investiga e cita aliás na introdução a importância do “feedback” dos alunos
para a construção do livro. Primeiro é a “lecture”, depois a discussão. O
professor Francisco Bethencourt promete aos 16 alunos uma surpresa à primeira
imagem: “É de um livro escrito no início do século XIV sobre xadrez e dá-nos
uma visão diferente da sociedade das três ordens na Europa. A origem do jogo de
xadrez é a Índia e o jogo veio para a Europa no século XI. A rainha pode mexer-se
em todas as direções...” O jogo de xadrez era um aperitivo para o tema
principal: a importância dos clãs guerreiros nas invasões bárbaras da Europa.
Mais à frente, lembra durante a discussão, “uma coisa é como a sociedade se
descreve, outra é como funciona”.
Para ler a entrevista de Francisco Bethencourt clique aqui
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