segunda-feira, 13 de março de 2023

"Fermentação" - Domicio Proença Filho


 



Fermentação

 

 

 




a cada negro


vendido


e, Europa, França e Bahia


o tesouro


d´El Rey


ria.




Mais de 200 por cento


por peça


menos a cria


o custo saía


de graça


e o tesouro


d´El Rey


ria.




Mais da metade


da carga


das cavernas


dos tumbeiros


morria


e o tesouro


d´El Rey


ria.




Mulheres rotas e nuas


Quem por elas choraria?


fardos negros



Arrasados


no porão


quem carpiria?


E o tesouro


d´El Rey


ria.




A boca dos verdes mares


comia


corpo de velhos,


infantes


a carga se reduzia


e o tesouro


d´El Rey


ria.




Os negreiros


aportavam


no cais da velha


Bahia


bolsas de ricos senhores


abertas com galhardia


aos dentes


pernas e braços


dos negros


e suas crias


e o tesouro d´El Rey


ria.




Regada a sangue


de negro


uma pátria se paria


e os párias


morriam secos


de fome


e de covardia


e o tesouro d´El Rey


ria.




Mas uma flor bela, antiga,


brotava na selva virgem


mãos negras a recolhiam


os braços, o orgulho


o peito


e a cerviz


se erguia:


no caminho do Quilombo


o tesouro d´El Rey


morria.

 

 

 



Domicio Proença Filho




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