José de Sousa Miguel Lopes - Livro "Cultura acústica e letramento em Moçambique: em busca de fundamentos antropológicos para uma educação intercultural"
“As questões de escolarização e de letramento que afetam o povo de Moçambique envolvem os decisivos problemas que a modernidade impôs aos povos da periferia do mundo ocidental e cristão; portanto, a nós brasileiros também. O autor nos incita a pensar que não há uma linha reta a unir a difusão da leitura e escrita em sociedades como a moçambicana e a partilha universal dos benefícios das culturas urbanas e tecnológicas” afirma a profa.
Mirian Jorge Warde.
O livro (672 págs.), que se encontrava esgotado, está agora disponível na versão sob demanda.
Prefácio
Este
prefácio é fruto dos costumes do ofício; a José Miguel Lopes deveriam caber os
exclusivos direitos de fazer o leitor compreender que as questões de
escolarização e de letramento, que envolvem o povo de Moçambique, estão
embebidas dos decisivos problemas que a modernidade impôs aos povos da
periferia do mundo ocidental e cristão; portanto, a nós brasileiros também.
Por
isso mesmo, a banca que avaliou a sua tese de doutorado, que agora vem a
público, não sugeriu a publicação: demandou-a.
Miguel
obriga a pensar sempre em questões nada fáceis e de respostas nada simples.
Eles nos incita a pensar que não há uma linha reta a unir a difusão da leitura
e escrita em sociedades como a moçambicana, e a partilha universal dos
benefícios das culturas urbanas e tecnológicas. Porque a palavra escrita não
carrega apenas os benefícios das belas-letras; ela pode ser, como mais das
vezes tem sido, o algoz da “cultura acústica”, da memória, do fio do tempo de
que cada membro de uma nova geração pode ser herdeiro e portador.
A
mim, Miguel teve a sensibilidade de ajudar a apreender a tensão entre “cultura
oral” e “cultura escrita” em toda a sua complexidade presenteando-me – em meio
à elaboração deste trabalho – com a primeira novela de seu conterrâneo Mia
Couto de uma série que eu mesma fui descobrindo e lendo afoitamente. Ambos
testemunham o sofrimento dos que dependem dos escreventes para preservar uma
cultura que só é possível pela oralidade.
José
Miguel não é dado a românticas críticas à escola; por isso, o leitor não corre
o risco de esbarrar, uma vez se quer, com fantasias milenaristas, regressos a
tempos perdidos. Sua reflexão carrega todo o senso das incongruências,
contradições, antinomias a que povos colonizados foram e são obrigados a
enfrentar na luta pela libertação política: descartar-se da metrópole ao mesmo
tempo que horizontes mais humanos de cultura vão sendo compostos.
O
povo moçambicano ensaiou esses horizontes, e viu seus esboços de futuro
borrados por protótipos culturais produzidos e reproduzidos por outras
sociedades. Brasil é, nesse sentido, o verso e o reverso de Moçambique.
José
Miguel fala de Moçambique como se lesse a palma da mão. Estava lá, entre as
lideranças revolucionárias que lutaram por uma nova cultura e uma nova
sociedade pautada em uma economia autônoma. Falando de Moçambique, contudo, ele
abre seu pensamento para os universais problemas de inclusão social por via da
escolarização.
Há
de se atentar para a maestria com que Miguel maneja vastíssima e atualizada
bibliografia em torno do seu foco central; sua destreza em rastrear diversas
posições teóricas e interrogá-las à luz das condições concretas do seu país de
origem, ao mesmo tempo que interroga aquelas condições com base na diversidade
empírica fornecida pela bibliografia compulsada, confere universalidade à
problemática moçambicana.
Assim,
experimentado dirigente educacional em tempos revolucionários, Miguel dá provas
de senhor dos ofícios acadêmicos do bem pensar. E não lhe parecendo ainda
suficiente, faz da sua escrita ensejo de um tanto desmentir Ítalo Calvino: seu
texto é a um só tempo leve e pesado; sombrio e iluminado; crítico e
esperançoso.
Conheci
Miguel por obra deliberada da sua então orientadora de mestrado, Lucíola
Licínio de Castro Paixão Santos, que repetindo a generosidade de que sempre me
dá provas, convidou-me para a banca de defesa da dissertação para que eu já me
encantasse com Miguel e me armasse de coragem para ser sua futura orientadora
de doutorado. Acho que Lucíola acertou em seu prognósticos: ganhei muito conhecendo-o.
Os anos de convívio na PUC-SP foram mais do que suficientes para pavimentar uma
amizade que, pelos meus prognósticos, será duradoura.
Torço
para que muitos além de mim e da banca que aprovou este trabalho, com enfáticas
recomendações para publicação, tenham a sorte de lê-lo. Assim como torço para
que a presença de Miguel em nossos meios acadêmicos se torne definitiva.
Fevereiro
de 2003.
Mirian
Jorge Warde
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