quinta-feira, 30 de junho de 2016

José de Sousa Miguel Lopes - Prefácio do livro "Tecnologias de extração do ouro em Minas Gerais: os saberes da África"




PREFÁCIO

Foi com enorme prazer que recebi o convite da Cláudia Márcia Coutinho Dias, para prefaciar seu livro “Tecnologias de extração do ouro em Minas Gerais: os saberes vindos da África”. Como africano, seu convite me colocou no patamar das discussões sobre fatos do processo colonial no Brasil, que, em alguma medida, têm a ver com o processo colonial ocorrido em meu próprio país: Moçambique.
Embora meus vínculos maiores sejam com a área da educação, o campo da História sempre me impregnou de modo profundo, sobretudo porque os inúmeros processos no campo político, histórico e educacional que hoje se vivem em Moçambique e com os quais me tenho confrontado, mergulham as suas raízes em acontecimentos que vêm desde o período colonial e, em seguida, prosseguiram no período pós-independência (1975), acontecimentos nos quais tive o privilégio histórico de participar ativamente. Vivenciei a agonia e queda do colonialismo, por força de uma luta armada de libertação nacional. Acompanhei “in loco” o processo que conduziu à independência de Moçambique, bem como as profundas transformações que se lhe seguiram e que levaram o país a envolver-se num projeto de construção do socialismo. Acompanhei, agora com certo distanciamento, o retorno ao processo capitalista num quadro de neoliberalismo selvagem que se instalou em Moçambique após a queda do socialismo real. Então, Cláudia permita-me o abuso da expressão, “respiro” História.
Entre outras questões, você analisa o papel desempenhado pelos escravos africanos que introduziram as técnicas de extração utilizadas durante muito tempo em Minas Gerais. Os saberes africanos existem de longa data, ao contrário do que uma historiografia eurocêntrica teimosa e equivocadamente difundiu até muito recentemente como saberes não existentes numa África despossuída de História. Não se deve ignorar que se quisermos comparar os Reinos africanos do Benin, Congo, Monomutapa, entre outros, com a civilização europeia da época, constata-se um nível civilizacional bastante avançado em termos de organização política, de sistemas de produção, de arte e de arquitetura.
Afastados pela geografia, mas próximos pelas raízes que a História não pode apagar, a ponte entre Moçambique e Brasil edifica-se a partir da sofrida noite do tráfico escravista. Como se sabe, para além de Moçambique, outras rotas de África (Daomé - atual Benin, o Senegal, a Nigéria, o Congo, Angola) foram utilizadas para enviar escravos para o Brasil.
Essa ponte Moçambique-Brasil prolonga-se com o desterro de inconfidentes que passaram os últimos anos de vida em terras moçambicanas e alarga-se, desde finais do século passado, com uma via de mão dupla em que moçambicanos aportam ao Brasil e brasileiros fazem o mesmo em relação a Moçambique, numa cada vez mais intensa busca de diálogo entre os dois povos.
Na comunidade dos que falam a língua portuguesa, comunidade nascida da viagem e da mestiçagem - que são elementos estruturantes de nossas culturas - Brasil e Moçambique não são apenas o outro lado do mar, mas o outro lado de nosso ser. O nosso modo próprio e único de sermos africanos e latino-americanos.
O homem que é ser no tempo e no lugar, “homem viajante”, em abertura ao futuro, de índole subjetiva, mas penetrado de acentos comunitários e proféticos. O tempo da memória é simultaneamente interior e exterior, enunciativo e social, voz e coro, expressão concreta de um sentir que se profere, da canção do homem na assunção dolorosa ou esfuziante da vida.
Estão ainda por fazer estudos que possam revelar o grau de sintonia ou de assintonia com o processo de colonização tal como ele ocorreu no Brasil e em Moçambique, porque finalmente, processos nascidos da mesma matriz colonial. Isto possibilitaria inclusive a realização de pesquisas bastante interessantes de uma história comparada, já que assente em uma mesma matriz colonial, com iniciativas relativamente semelhantes em continentes diferenciados.
O tema da pesquisa da Cláudia, de que resultou este livro, coloca em pauta a História das técnicas de mineração do ouro durante o século XVIII e início do século XIX em Minas Gerais, bem como o modo como esse “saber” foi transmitido e por quem durante aquele período.
Por isso, Cláudia, eu considero o seu trabalho de pesquisa de muita significação, não apenas para aquilo que você tenta aprofundar relativamente à História do Brasil, e em particular á História Regional brasileira, mas também pela luz que ele poderá fazer em relação a processos de pesquisa que urge realizar sobre os saberes e técnicas dos escravos moçambicanos que vieram para o Brasil.
Por outro lado também, o seu estudo apresenta uma documentação bem vasculhada. Sobretudo, tem indicações muito interessantes para se pensarem o modo semelhante como Portugal procurava manter sua colônia americana e as colônias africanas, como fornecedoras de matéria-prima e consumidoras de produtos manufaturados, dando suporte para o chamado “exclusivismo comercial”, tão importante para a economia europeia.
No que ao tráfico de escravos diz respeito, não se pode ignorar que os traficantes os utilizavam como mão-de-obra barata, num dos mais gigantescos e terríveis episódios de violência cometidos contra seres humanos. Os dados estatísticos relativos ao tráfico de escravos bem como os mecanismos de violência física e simbólica utilizados contra eles são espantosos. Tais dados revelam que esse comércio durou cerca de 350 anos, tendo quatro milhões de negros vindo para o Brasil (muitos foram para Cuba, Venezuela e Caribe). Não menos surpreendente, eram os mecanismos utilizados pelos traficantes visando destruir toda uma cultura. Com efeito, os negros eram obrigados a percorrer 5 km até ao porto de embarque. Em seguida, os homens eram obrigados a dar nove voltas e as mulheres sete voltas em torno da Árvore do Esquecimento, para ficarem sem capacidade de reagir, de se rebelar para, em suma, esquecerem a sua cultura. Como se fosse possível tal destruição cultural!
Não se deve igualmente esquecer que nos porões dos navios que vinham para as Américas não vinha apenas força-de-trabalho, mas costumes, tradições, visões de mundo. Assim a presença da África manifesta-se na consciência brasileira nas cores, nas gestualidades, na forma de falar a língua portuguesa, nas danças, nas comidas, na religiosidade.
Certamente seu trabalho não dá todas as respostas, mas nele encontramos um estudo minucioso em relação: à forma como, no decorrer do século XVIII, a Capitania de Minas Gerais passa a ser o centro econômico do Brasil e motivo de preocupação para Portugal, tornando-se necessário controlar e manter em segredo (através da adoção da censura às publicações) a existência de riquezas minerais, evitando que exploradores estrangeiros tomassem conhecimento delas e procurassem, também eles, minerar o ouro; às medidas cada vez mais rigorosas tomadas por Portugal no decorrer do século XVIII, no intuito de obter lucros sempre maiores com a extração do ouro. Com efeito, através de um sistema de arrecadação (imposto sobre a capitação) estável e sem flutuações, passou a cobrar-se de toda a população o que faltasse para completar o pagamento do quinto do ouro; às formas de controle sobre os mineiros que levaram a várias revoltas de camadas importantes da população, e posteriormente em outros lugares do Brasil, principalmente à revolta dos escravos negros (malês) na Bahia; aos modos de extrair o ouro que iam, desde os faiscadores, que simplesmente o catavam com as mãos nos leitos dos rios até aos sucessivos processos de extração, como a introdução dos pratos de estanho, o represamento da água dos rios, os tabuleiros nas suas margens, a introdução da nora, dos lavadouros chamados canoas, o mergulho até aos joelhos nas águas do rio, a extração na grupiara (o que jaz ou fica entre os seixos), a quebra do material a céu aberto com uma espécie de malho de ferro, a cata (poço em forma de funil), o talho aberto, a bateia, o almocrafe, os guinchos, as máquinas de ventilação, os pilões, etc.; ao “saber” do negro que trabalhava na mineração do ouro e que era diferenciado de outros, pois ele sabia ler e escrever, enquanto a maioria da população não o fazia; os negros Mina, por exemplo, se fizeram presentes durante todo o processo da economia colonial, desde a lavoura açucareira, até á descoberta das minas de ouro, e se mantiveram participantes ao longo do século XIX.
Sabemos que a História do tempo presente, mais do que qualquer outra é, por natureza, uma História inacabada: uma História em constante movimento, refletindo as comoções que se desenrolam diante de nós e sendo, portanto, objeto de uma renovação sem fim.
Um trabalho de pesquisa, não se deve esquecê-lo, é também um lugar de luta, e a História pode e tem que ser uma forma de luta político-cultural. Ela tem, para além da tarefa de expandir as capacidades humanas, favorecer análises e processos de reflexão em comum da realidade, desenvolver nos seres humanos procedimentos e habilidades imprescindíveis para sua atuação responsável, crítica, democrática e solidária na sociedade.
Estes argumentos podem ser válidos, mas frequentemente parece difícil chegar a um consenso sobre modo de colocá-los em prática. Isto pode-nos desencorajar e conduzir-nos ao pessimismo quando olhamos o que deve ser feito e constatamos a aparente imobilidade das mudanças que estão indo por caminhos que não me parecem os mais adequados. O homem existe por estender constantemente seu ser para o futuro, tanto em sua consciência como em sua atividade. Dito de outra forma, o homem se realiza em projetos. Não qualquer projeto, como é óbvio. Uma dimensão essencial desta “futuridade” do homem é a esperança. É através da esperança que os homens superam qualquer situação do aqui e agora e é nela que me apoio para dizer que tenho esperança que o mundo atual possa corrigir seu rumo.
É isso mesmo que você faz, quando paciente e laboriosamente se entrega a uma pesquisa sobre o contexto brasileiro da época, ao percurso sobre as técnicas existentes para a extração do ouro em Minas Gerais e à importância do trabalho escravo na mineração, com ênfase nos negros Mina. Martelando cada experiência, como o cortador de pedras faz em relação á sua matéria prima, dá-nos o exemplo da persistência, balizado pela certeza que cada experiência bem sucedida é resultante de todas as outras experiências anteriores. Em decorrência, quem fica ganhando é o leitor de “Tecnologias de extração do ouro em Minas Gerais: os saberes vindos da África”.


José de Sousa Miguel Lopes
(Doutor em História e Filosofia da Educação)






"O show do guitarrista português Carlos Araújo"


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"O Amor" - Vladimir Maiakovski


O Amor
Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
numa alameda do zôo,
sorridente,
tal como agora está
no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o exame
de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então,
de todo amor não terminado
seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me,
nem que seja só porque te esperava
como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me,
nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo
de casamentos,
concupiscência,
salários.
Para que, maldizendo os leitos,
saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia,
que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
– Camaradas!
Atenta se volte a terra inteira.
Para viver
livre dos nichos das casas.
Para que doravante
a família seja
o pai,
pelo menos o Universo,
a mãe,
pelo menos a Terra.
Vladimir Maiakovski (1893-1930)

As relações étnico-raciais sob o crivo da psicologia


As relações étnico-raciais têm sido tratadas predominantemente no Brasil como um tema da História (nos estudos sobre a escravidão e a reorganização do país após a abolição), da Sociologia (nas pesquisas sobre as raízes e atual configuração da sociedade brasileira), da Economia (em análises sobre perfil de renda, participação no mercado de trabalho etc.) ou do Direito (nas interpretações da Constituição e do Código Civil). Mas, apesar da evidente repercussão psicológica das questões de raça, desigualdade racial, preconceito e discriminação, o assunto foi menos investigado no âmbito da Psicologia.
Para ler o texto completo de José Tadeu Arantes clique aqui

A desintegração do mundo neoliberal: o piloto do golpe sumiu


A demanda por recheios distintos da rendição aos mercados vai acabar produzindo a sua oferta, mas o tempo para as respostas democráticas encurtou. 

Para ler o texto completo de Saul Leblon clique aqui

Onde está a Inglaterra: no Brexit ou no brejo?

flávio aguiar brexit

Reino Unido, Grã-Bretanha e Inglaterra não são sinônimos. O Reino Unido é formado por quatro nações, entre elas a Inglaterra, além do País de Gales, da Escócia e da Irlanda do Norte. A Grã-Bretanha é uma ilha que abriga três destes países, sendo que a Escócia se distribui também por outras ilhas e a Irlanda do Norte fica numa ilha à parte. Finalmente, a Inglaterra sedia a capital do Reino Unido, Londres. E foi eliminada da Eurocopa 2016 pela pequena e heroica Islândia. O País de Gales continua na competição e joga contra a Bélgica na sexta-feira. A Irlanda do Norte foi eliminada antes e a Escócia sequer entrou na primeira fase, a dos grupos.
Para ler o texto completo de Flavio Aguiar clique aqui

ALEX CASTRO: prisão eu


O que chamo de as prisões são sempre prisões cognitivas: armadilhas mentais que construímos para nós mesmas, mentiras gigantescas que nunca questionamos, escolhas hegemônicas que ofuscam possíveis alternativas. 
Para ler o texto completo de Alex Castro clique aqui

sexta-feira, 24 de junho de 2016

'Estudos de neurociência superaram a psicanálise', diz pesquisador brasileiro

O neurocientista Ivan Izquierdo durante congresso em Buenos Aires

O neurocientista Ivan Izquierdo durante congresso em Buenos Aires
O eurocientista Ivan 

'Estudos de neurociência superaram a psicanálise', diz pesquisador brasileiro

JULIANA CUNHA


ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES


18/06/2016 

Com 60 anos de carreira, 22.794 citações em periódicos, 60 premiações e 710 artigos publicados, Ivan Izquierdo, 78, é o neurocientista mais citado e um dos mais respeitados da América Latina. Nascido na Argentina, ele mora no Brasil há 40 anos e foi naturalizado brasileiro em 1981. Hoje coordena o Centro de Memória do Instituto do Cérebro da PUC-RS.
Suas pesquisas ajudaram a entender os diferentes tipos de memória e a desmistificar a ideia de que áreas específicas do cérebro se dedicariam de maneira exclusiva a um tipo de atividade.
Ele falou à Folha durante o Congresso Mundial do Cérebro, Comportamento e Emoções, que aconteceu esta semana, em Buenos Aires. Izquierdo foi o homenageado desta edição do congresso.
Na entrevista, o cientista fala sobre a utilidade de memórias traumáticas, sua descrença em métodos que prometem apagar lembranças e diz que a psicanálise foi superada pelos estudos de neurociência e funciona hoje como mero exercício estético.

Folha - É possível apagar memórias?

Ivan Izquierdo - É possível evitar que uma memória se expresse, isso sim. É normal, é humano, inclusive, evitar a expressão de certas lembranças. A falta de uso de uma determinada memória implica em desuso daquela sinapse, que aos poucos se atrofia.
Fora disso, não dá. Não existe uma técnica para escolher lembranças e então apagá-las, até porque a mesma informação é salva várias vezes no cérebro, por um mecanismo que chamamos de plasticidade. Quando se fala em apagamento de memórias é pirotecnia, são coisas midiáticas e cinematográficas.
O senhor trabalha bastante com memória do medo. Não apagá-las é uma pena ou algo a ser comemorado?
A memória do medo é o que nos mantém vivos. É a que pode ser acessada mais rapidamente e é a mais útil. Toda vez que você passa por uma situação de ameaça, a informação fundamental que o cérebro precisa guardar é que aquilo é perigoso. As pessoas querem apagar memórias de medo porque muitas vezes são desconfortáveis, mas, se não estivessem ali, nos colocaríamos em situações ruins.

Claro que esse processo causa enorme estresse. Para me locomover numa cidade, meu cérebro aciona inúmeras memórias de medo. Entre tê-las e não tê-las, prefiro tê-las, foram elas que me trouxeram até aqui, mas se pudermos reduzir nossa exposição a riscos, melhor. O problema muitas vezes é o estímulo, não a resposta do medo.
Mas algumas memórias de medo são paralisantes, e podem ser mais arriscadas do que a situação que evitam. Como lidar com elas?
Antes parado do que morto. O cérebro atua para nos preservar, essa é a prioridade. Claro que esse mecanismo é sujeito a falhas. Se entendemos que a resposta a uma memória de medo é exagerada, podemos tentar fazer com que o cérebro ressignifique um estímulo. É possível, por exemplo, expor o paciente repetidas vezes aos estímulos que criaram aquela memória, mas sem o trauma. Isso dissocia a experiência do medo.

Isso não seria parecido com o que Freud tentava fazer com as fobias?
Sim, Freud foi um dos primeiros a usar a extinção no tratamento de fobias, embora ele não acreditasse exatamente em extinção. Com a extinção, a memória continua, não é apagada, mas o trauma não está mais lá.

Mas muitos neurocientistas consideram Freud datado.
Toda teoria envelhece. Freud é uma grande referência, deu contribuições importantes. Mas a psicanálise foi superada pelos estudos em neurociência, é coisa de quando não tínhamos condições de fazer testes, ver o que acontecia no cérebro. Hoje a pessoa vai me falar em inconsciente? Onde fica? Sou cientista, não posso acreditar em algo só porque é interessante.

Para mim, a psicanálise hoje é um exercício estético, não um tratamento de saúde. Se a pessoa gosta, tudo bem, não faz mal, mas é uma pena quando alguém que tem um problema real que poderia ser tratado deixa de buscar um tratamento médico achando que psicanálise seria uma alternativa.
E outros tipos de análise que não a freudiana?
Terapia cognitiva, seguramente. Há formas de fazer o sujeito mudar sua resposta a um estímulo.

O senhor veio para o Brasil com a ditadura na Argentina. Agora, vivemos um processo no Brasil que alguns chamam de golpe, é uma memória em disputa. O que o senhor acha disso enquanto cientista?
Eu vim por conta de uma ameaça. Não considero um golpe, mas é um processo muito esperto. Mudar uma palavra ressignifica toda uma memória. Há de fato uma disputa de como essa memória coletiva vai ser construída. A esquerda usa o termo golpe para evocar memórias de medo de um país que já passou por um golpe. Conforme essa palavra é repetida, isso cria um efeito poderoso. Ainda não sabemos como essa memória será consolidada, mas a estratégia é muito esperta.


A jornalista JULIANA CUNHA viajou a convite do Congresso Mundial do Cérebro, Comportamento e Emoções.

FONTE: Aqui

Leia também “Um teste para prever a resposta aos antidepressivos” de Daniel Mediavilla clicando aqui


José de Sousa Miguel Lopes - "Carta aberta aos professores e alunos: a obrigação ética de dizer 'não' às guerras"


A guerra é o ato mais sangrento passível de acontecer, por subordinar ao terrorismo dos que têm mais força, os inocentes que vão ao altar do sacrifício, os seres humanos não possuidores de outros bens além dos seus próprios corpos, memória, ideais, família, princípios e objetivos de vida.
Embora este texto tenha sido publicado em 2004, ele não perdeu atualidade pelo que o disponibilizo aos leitores do blog. Basta clicar em cima do título do 1º artigo do Sumário “Carta aberta aos professores e alunos: a obrigação ética de dizer ‘não’ às guerras”.

ELIANE BRUM; O golpe e os golpeados


A barbárie de um país em que as palavras já não dizem.

Para ler o texto completo de Eliane Brum clique aqui

Žižek: Precisamos entender a esquerda que apoiou o Brexit

Zizek Brexit

Quando perguntaram ao camarada Stalin no final dos anos 1920 o que ele achava pior, a direita ou a esquerda, ele imediatamente rebateu: “Os dois são piores!” E essa é minha primeira reação ao Brexit. A Europa está presa agora em um círculo vicioso, oscilando entre dois falsos opostos: de um lado, a rendição ao capitalismo global, e de outro, a sujeição a um populismo anti-imigração. É preciso colocar a pergunta: qual é o tipo de política capaz de nos tirar desse impasse?
Para ler o texto completo de Slavoj Žižek clique aqui

O programa 'Escola sem Partido' quer uma escola sem educação

Sala de aula vazia em Itapevi, São Paulo.

Se os projetos de lei vingarem, o Brasil estabelecerá um paradoxo: uma escola sem voz, sem liberdade, sem divergências, sem cidadania, sem questionamento, sem reflexão, sem política, sem economia, sem artes, sem apropriação de cultura. 

Para ler o texto completo de Daniel Cara clique aqui 

Leia "Escola Sem Partido: Doutrinação comunista, Coelho da Páscoa e Papai Noel" de Leonardo Sakamoto clicando aqui

Waldemar Bastos: "Em Angola querem calar a música da alma"


É uma das figuras maiores da música angolana, portuguesa, do mundo. E tem sido também nos últimos tempos uma voz incômoda para o governo angolano. Esta sexta-feira, Waldemar Bastos, apresenta-se na Gulbenkian, mais frontal do que nunca.
Para ler o texto de Vítor Belanciano clique aqui

MONIZ BANDEIRA/ENTREVISTA: 'EUA querem bases em Ushuaia e na Tríplice Fronteira'

Casa Rosada/ Gobierno de Argentina

Moniz Bandeira afirma que bases militares estão em processo de negociação entre Washington e o governo de Mauricio Macri.

Para ler a entrevista de Moniz Bandeira clique aqui 

sábado, 18 de junho de 2016

José de Sousa Miguel Lopes & Inês Assunção de Castro Teixeira: Apresentação da Coletânea "A diversidade cultural vai ao cinema"

A diversidade cultural vai ao cinema

Nesta Coletânea discute-se a diferença e os diferentes, sob diversos ângulos, situações, contextos, imagens e enredos. Sob distintos olhares e sensibilidades, dos/as diretores/as das películas e dos autores/as colaboradores/as, a diversidade cultural é apresentada e debatida, sempre na perspectiva de que os diferentes são iguais enquanto espécie, enquanto sujeitos, enquanto seres de direitos, vivendo a dialética da igualdade e da diferença, duas faces da liberdade e da justiça. Este é o nosso convite: compreender e viver nossos registros culturais como apenas mais um dentre os muitos possíveis, abrindo-nos para a aventura do encontro com a alteridade.

Para ler o Prefácio de Tania Dauster e a Apresentação da Coletânea "A diversidade cultural vai ao cinema" por José de Sousa Miguel Lopes & Inês Assunção de Castro Teixeira clique aquiEm seguida, por baixo da capa da Coletânea, clique em Amostra

ANTÓNIO NÓVOA - Universidade em tempo de crise



António Nóvoa, professor catedrático do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e reitor honorário da instituição, proferiu no dia 14/06/2016 uma palestra na Universidade do Estado do Rio de Janeiro num evento promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Educação (ProPEd).
Sua fala tem início no minuto 22. Para assistir à palestra de cerca de duas horas clique no vídeo aqui

O Estado ao serviço de interesses privados e de uma religião?


A zaragata dos colégios privados em Portugal mostrou, afinal, que, para muitos liberais, sem cabedais de Estado não há mercado.
Para ler o texto completo de Santana Castilho clique aqui

"A Internet chegou para provar que somos um dos países mais racistas do mundo"


Paulo Rogério Nunes estuda o racismo nas redes sociais e defende que o discurso do ódio é a base da "abissal desigualdade" no Brasil.

Para ler o texto completo de María Martín clique aqui

CHRIS REA: "The Truth" & "And You My Love"


Para assistir à interpretação de "The Truth" por Chris Rea clique aqui


Para assistir à interpretação de "And You My Love" por Chris Rea clique aqui

A democracia no tempo do neoliberalismo


Avolumam-se nos dias de hoje as contradições da democracia, enquanto sistema político que formalmente tem vindo a generalizar-se aos regimes e governos da maioria dos países do mundo, e o neoliberalismo capitalista, pretensamente seu defensor e até “promotor”, que igualmente comanda as políticas e os governos da maioria dos países.
Para ler o texto completo de Vítor Ruivo clique aqui

"Chutando o balde do Século XX" - Joaquim Aragão


A nação, mas também a comunidade internacional, assiste atônica a reviravolta política que se abateu sobre o Brasil, impondo uma mudança de 180 graus na orientação estratégica dessa sétima economia do mundo. O País, a qual essa comunidade atribuía um clima de entusiasmo e de exemplar mudança social, entrou assim no círculo de fogo que arde em diversas partes do mundo.
Para ler o texto restante da Parte 1 de Joaquim Aragão clique aqui

Para ler a parte 2 clique aqui

Para ler a parte 3 clique aqui


Para ler a parte 4 clique aqui

terça-feira, 14 de junho de 2016

José de Sousa Miguel Lopes & Inês Assunção de Castro Teixeira: Apresentação da Coletânea "A mulher vai ao cinema"

A mulher vai ao cinema

Para ler o Prefácio de Eliane Marta Teixeira Lopes e a Apresentação da Coletânea "A mulher vai ao cinema" por José de Sousa Miguel Lopes & Inês Assunção de Castro Teixeira clique aquiEm seguida, por baixo da capa da Coletânea, clique em Amostra

"Não há amor feliz" ("Il n'y a pas d'amour heureux") - Louis Aragon (1897-1982)


Não há amor feliz ("Il n'y a pas d'amour heureux”)

Nada é definitivo na vida de um homem
Nem a sua força nem a sua fragilidade nem o seu coração
Quando acredita abrir os braços num abraço
A sombra é a de uma cruz
Quando acredita agarrar a felicidade descobre uma ferida
A vida é um estranho e doloroso divórcio

Não há amor feliz

A  vida é um soldado sem armas
Fardado para outros destinos
De pouco serve acordar cedo
Quando ao fim da tarde se é assaltado pelas incertezas
E dizer as palavras Minha Vida para calar as lágrimas

Não há amor feliz

Meu belo amor meu querido amor minha tristeza
Estás dentro de mim como um pássaro ferido
Quem nos vê passar nada sabe
Comigo repetem essas palavras que gravo
 E morrem de súbito no teu olhar profundo

Não há amor feliz

É tarde demais para aprender a viver
Os nossos corações unidos choram noite dentro
Quantos desgostos ultrapassámos para conquistar um arrebatamento
Quantos infortúnios experimentámos para escrever esta pequena canção
Quantos lamentos trocámos para arrancar estes sons de uma guitarra

Não há amor feliz

Não há amor sem dor
Não há amor que não morra
Não há amor que não seque
Não há amor maior que o teu amor pela pátria
Não há amor que não viva entre lágrimas
Não há amor feliz
Mas é esse o nosso amor o amor de nós dois

Louis Aragon (1897-1982)

Ouça o poema "Il n'y a pas d'amour heureux” na voz de
  • ·       Françoise Hardy (1967) clicando aqui 
  • ·       Nina Simone (1993) clicando aqui 

Immanuel Wallerstein: EUA, a eleição como sintoma do declínio


Crescimento de candidatos anti-establishment marca o fim de um período. Além de influência global, país perde coesão interna. E a “era de ouro” não voltará…
Para ler o texto de Immanuel Wallerstein clique aqui

Produtivismo e alienação na Universidade

Sala-de-aula

Debate realizado na Unicamp lança luz sobre as principais patologias universitárias contemporâneas.
Para ler o texto de Thomaz Wood JR. clique aqui

Leia também "Precisamos falar sobre a vaidade na vida acadêmica" de Rosana Pinheiro- Machado clicando aqui

Vladimir Safatle: A crise é um modo de governo


A crise é um modo de governo

Vladimir Safatle

10/06/2016 

"Aos nossos Amigos: Crise e Insurreição" é um pequeno livro de um conjunto de autores anônimos chamado Comitê Invisível. Ele acaba de ser lançado no Brasil (n-1 Edições) em um momento que não poderia ser mais propício. Sua capacidade de apresentar teses sobre a natureza dos impasses da vida contemporânea é algo que há muito havia desaparecido das prateleiras das livrarias.
"Desde 2008, vivemos em constante ritmo de insurreição", dizem os autores. Nosso maior erro é não perceber como estamos, seja no Brasil, na Turquia, na Espanha, na Tunísia ou na Grécia, em um processo mundial de contestação e desencanto. Faz parte de uma lógica de gestão de crise mundial dar a impressão de que estamos todos a lutar contra governos locais e aparatos nacionais de poder.
No entanto, esses governos são apenas repetidores de uma mesma política global, que parece saída da mesma cabeça, feita com maior ou menor intensidade. Nossas discussões são sobre intensidades da mesma política, sobre se tais direitos serão ou não desmontados, sobre qual a intensidade dos cortes, não sobre caminhos alternativos.
Essa homogeneidade mostra duas coisas fundamentais. Primeiro, que nenhuma saída será local ou nacional. Segundo, e mais importante, que apenas a perpetuação de um estado permanente de choque poderia nos levar a tamanha limitação da capacidade de pensar. O que talvez nos explique por que a crise não é algo a ser combatido pelas práticas de governo. Há muito a crise se tornou a própria prática de governo. Previne-se, por meio de uma crise permanente, toda e qualquer crise real.
O que significa que essa crise que aparece diariamente nos jornais não passará. Ela ficará continuamente como um fantasma a justificar toda "austeridade". Haverá sempre um corte na previdência a fazer, uma restrição orçamentária a impor, gordura a cortar em uma "reestruturação permanente de tudo" que só não mudará uma coisa: a defesa da elite patrimonial, os rendimentos da oligarquia financeira.
Mas para submeter populações inteiras a tal regime de governo faz-se necessária uma verdadeira engenharia psicológica de duas mãos.
De um lado, vende-se a ideia de que a crise "é o momento vivificante da 'destruição criadora' que cria oportunidades, inovação, empreendedores, em que só os melhores, os mais motivados, os mais competitivos sobreviverão". Ou seja, a crise seria o momento no qual a coragem como virtude poderia aparecer. Por isso, os que temem a crise, procurando proteção, só poderiam estar a agir como crianças. Eles não são sujeitos conscientes da falácia de uma destruição criadora que sempre poupa aqueles bem nascidos. Eles são crianças mimadas.
Não por acaso, as políticas de gestão da crise são chamadas de políticas de "austeridade". O termo remete à lógica protestante de uma vida austera, responsável, adulta e realista contra o dispêndio, o excesso e a irresponsabilidade. Ele traz no seu bojo a ideia de que, enquanto você trabalhava, alguns "vagabundos" se aproveitavam, não precisando se impor uma vida restrita como a que você foi obrigado a suportar. É contra os "privilégios" desses mimados que todos deveriam lutar.
O raciocínio é primariamente falso. Se alguém está a procurar "vagabundos" deveria começar por olhar no topo do sistema financeiro e na casta rentista da elite brasileira, não nas classes historicamente desfavorecidas. Mas isso pouco importa, pois o discurso da austeridade não se sustenta em algum dado de realidade, mas na tentativa de impor uma ética por trás de conjuntos de práticas de governo. Por isso, é no terreno ético que o combate deve iniciar.
Daí uma compreensão decisiva: "O que acontece hoje não é apenas que alguns queiram impor uma austeridade econômica a outros que não a desejam. O que acontece é que alguns consideram que a austeridade é, em absoluto, algo bom, enquanto que outros consideram, sem de fato ousar afirmar tanto, que a austeridade é, em sua totalidade, uma miséria".
Como essa "vida austera", há de se impor uma outra ideia de vida, baseada na partilha em vez da economia, na conversa em vez do silêncio, no excesso ao invés da restrição. A austeridade sempre foi a forma de restringir a vida de muitos para garantir o gozo de poucos. Eis algo que aparece na base da crise como modo de governo. 
FONTE: Aqui

ELIANE BRUM: Entre a manipulação da Bíblia e a posse da Vagina


O levante das mulheres contra a cultura do estupro no país governado pelo interino Michel Temer (PMDB) e pelo Congresso mais retrógrado desde a redemocratização forma o retrato mais preciso desse momento histórico tão particular do Brasil. A oposição atual não é entre um governo chamado de “golpista” e um governo que já foi apresentado como “popular”. Ou entre a presidente afastada pelo processo de impeachment e o vice que conspirou para afastá-la. O embate é entre o Brasil que emergiu das manifestações de junho de 2013 e o Brasil que se agarra aos privilégios de classe, de raça e de gênero. É esse o confronto político mais amplo que determina o curso dos dias.
Para ler o texto completo de Eliane Brum clique aqui

"Preciso me encontrar" - Zeca Pagodinho, Marisa Monte, Yamandú Costa, Hamilton de Holanda


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sábado, 11 de junho de 2016

José de Sousa Miguel Lopes - Prefácio do livro "A Educação Politécnica e a Escola do Trabalho em Moçambique: novas e velhas falácias pedagógicas?”


Prefácio

Senti-me muito honrado com o amável convite do António Cipriano Parafino Gonçalves para escrever o Prefácio de seu livro “A Educação Politécnica e a Escola do Trabalho em Moçambique: novas e velhas falácias pedagógicas?”.
Acompanhei de perto o percurso acadêmico do António Cipriano Parafino Gonçalves na Universidade Federal de Minas Gerais, tendo o privilégio de ter participado como membro da Banca da dissertação de Mestrado bem como da Banca da Tese de Doutorado ambas defendidas naquela prestigiada Universidade.
Da sua pesquisa de Mestrado resultou este livro que em boa hora, chegará às mãos dos leitores. O tema de seu estudo coloca em diálogo, precipuamente, a concepção de educação politécnica em seu diálogo com a escola do trabalho em Moçambique.
É um trabalho de muita significação por aquilo que tenta aprofundar relativamente à educação politécnica e, em particular, no caso moçambicano. O trabalho, além de apresentar uma documentação bem vasculhada, tem indicações muito interessantes para se pensarem problemas, para se pensarem soluções em processos em que configuram a construção de novas práticas com vista a uma genuína politecnia na educação, visando a omnilateralidade do ser humano.
Certamente, António Cipriano não dá todas as respostas, mas nele encontramos uma postura crítica bastante aguçada em relação a vários aspectos do sistema educacional moçambicano.
A pesquisa bibliográfica e documental encarou as hipóteses como atos criativos, numa crítica contundente a toda e qualquer ortodoxia acadêmica. A abordagem teórica, realizada nos marcos do pensamento marxista, revela-se da maior pertinência, pois é aquele que melhor pode iluminar o objeto de estudo que foi definido.
Como se sabe, Marx lançou os fundamentos de uma concepção radicalmente nova de fazer ciência e filosofia e, portanto, de compreender o mundo. Isto quer dizer que o fundamento da luta revolucionária está primeiramente na ontologia (natureza do ser social) e só depois na política e na ética.
Compreensão esta que deve permitir explicar como os homens (e só eles) fazem a história, por que a fizeram deste modo e como poderão superar a atual forma de sociabilidade.
Quais são, então, os elementos essenciais, que caracterizam a perspectiva marxiana e a demarcam como um patamar radicalmente novo de filosofia e cientificidade? Em síntese, podemos dizer que o núcleo mais essencial se encontra na demonstração da radical historicidade e socialidade do mundo dos homens e na identificação da correta articulação entre subjetividade e objetividade.
Examinando, então, o ato do trabalho, Marx constata que ele é um intercâmbio entre o homem e a natureza, através do qual o homem transforma esta última, adequando-a à satisfação das suas necessidades. Ressalta, contudo, que, ao transformar a natureza, o homem também se transforma a si mesmo. O ato do trabalho, por sua vez, é o resultado da síntese de dois elementos essenciais: a prévia-ideação e a realidade natural objetiva. A mediação entre estes dois elementos será constituída pela categoria da práxis.
Disto decorre, para Marx, que o trabalho é o ato a partir do qual o homem se cria a si mesmo, o ato que estabelece uma ruptura com o ser natural e dá origem ao ser social. Estabelecido este salto constituidor de um novo tipo de ser, todo o restante da história nada mais será do que o processo de tornar-se cada vez mais social do ser social.
A partir desses pressupostos ontológicos, também toda a problemática relativa ao conhecimento científico ganha uma abordagem inteiramente nova. A resposta às questões epistemológicas, tais como: qual a natureza essencial da ciência; o que são o objeto e o sujeito do conhecimento e qual a relação entre eles; o que é a verdade e quais os critérios para defini-la; quais as possibilidades e os limites da razão; o que é o método científico; qual a relação entre juízos de fato e juízos de valor, sempre terão um equacionamento de caráter ontológico-prático, vale dizer, a partir da integralidade do processo histórico-social e não de caráter formalista, como é o caso das respostas que partem da perspectiva subjetivista moderna.
Como consequência, a concepção moderna de ciência, até hoje largamente dominante, exatamente por operar apenas sobre o mundo fenomênico, chega a um dilema do qual é incapaz de se livrar. Ou produz um conhecimento que apenas contribui para a reprodução desta forma de sociabilidade ou, quando se pretende crítica, é incapaz de ultrapassar o círculo estreito da denúncia ou do humanismo abstrato.
Ao contrário, a ciência marxiana, de caráter ontológico, produz, necessariamente, um conhecimento de caráter revolucionário, vale dizer, um conhecimento que, ao apanhar o objeto na sua integralidade (essência/fenômeno, totalidade), evidencia, ao mesmo tempo, as tendências mais profundas que se configuram no seu interior e, entre elas, a possibilidade de superação dessa forma particular em direção a uma forma superior.
O novo patamar filosófico-científico instaurado por Marx tem como características: apreender a realidade social como algo que é integralmente resultado da atividade social dos próprios homens, ainda quando se lhes opõe como um poder hostil (alienação); compreendê-la como uma totalidade de partes, articuladas, em processo, cuja matriz fundante é o trabalho; nunca perder de vista que qualquer fenômeno social é sempre o resultado da interação entre subjetividade e objetividade; ao fazer ciência, partir dos dados imediatos, mas dissolvê-los, buscando a lógica mais profunda da qual eles são uma manifestação e, com isso, fazer emergir a possibilidade de superação de sua forma atual.. E é esta forma de fazer ciência e filosofia que deve ser resgatada se se quer um instrumento teórico adequado às enormes tarefas que a classe trabalhadora tem pela frente com o objetivo de superar o capitalismo e construir uma autêntica comunidade humana.
O trabalho de António Cipriano, ao refletir a problemática da educação politécnica em Moçambique sinaliza esta direção.
Se o objetivo da pesquisa era contribuir para uma melhor compreensão sobre a concepção da educação politécnica em Moçambique e das suas contradições então, acredito que o caminho trilhado se coaduna com esse objetivo, pois este estudo, tanto em termos de linguagem, quanto da colocação do problema e desenvolvimento das análises é bastante acessível e coerente com seu propósito.
Numa época em que talvez se devam abandonar as utopias universalizantes e as certezas absolutas sobre as coisas, penso, no entanto, que algumas certezas, algumas utopias são cruciais, especialmente as relacionadas com as condições de existência material e espiritual da humanidade, tais como a resistência à exploração social, à opressão, á dominação e à injustiça, males infelizmente ainda fortemente presentes no nosso país.
Toda a mudança implica uma escolha entre uma trajetória a seguir e outras a deixar para trás. A compreensão do contexto, dos processos e das conseqüências da mudança ajuda-nos a clarificar e a questionar estas escolhas. As opções que fizermos dependerão, em última instância, da profundidade deste entendimento, mas também da criatividade das nossas estratégias, da coragem das nossas convicções e da orientação dos nossos valores. Consequentemente, o que atrás propus deve ser visto não como um conjunto de regras definitivas para o aperfeiçoamento e (ou) de listas de práticas de sucesso. Ao invés disso, apenas coloquei em discussão, algumas das opções com que nos defrontamos em Moçambique, quando encontramos a mudança educativa ou a realizamos nós próprios no mundo contemporâneo. Porque, se conseguirmos compreender os rumos possíveis da mudança, talvez possamos no futuro ser mais capazes de lhe tomar as rédeas.
Se tiver consciência que as mudanças de fundo deverão ocorrer ao nível da sociedade mais vasta, penso também que pequenas ações, guiadas pela vontade de mudar e apoiadas num trabalho paciente podem, aos poucos, produzir fissões na estrutura aparentemente sólida no sistema educacional moçambicano. É este trabalho paciente de que resultou este livro, que me habilita a vaticinar que ele será um momento de grande importância para todos aqueles que tiverem o privilégio de lê-lo, sobretudo, os educadores.


José de Sousa Miguel Lopes
Doutor em História e Filosofia da Educação
Professor na Universidade do Estado de Minas Gerais

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