sábado, 21 de janeiro de 2023

"Na Foz do Douro, frente à casa de Eugénio de Andrade" - Adão Cruz

 




Na Foz do Douro, frente à casa de Eugénio de Andrade

 

 

 




Generoso abraço



verdade solitária!



O mar infindo onde colhes as palavras



e o pequeno gesto da areia fina



bulida dos pés das gaivotas.



Entra-me nos olhos o mar



como em ti.



Como tu



tenho os olhos inundados de mar



mas fogem-me as sílabas férteis



que ele te põe nos lábios e nos versos.



A vibração das palavras d’água



salva-me da paz sacrificial



das rochas eretas e firmes.



Quase me sinto futuro



aqui



a lembrar que o passado só existe



para enganar o presente.



Sinto-me bem



aqui



ao lado do possível e do impossível



na orla do silêncio das tuas palmeiras



saboreando o Sal da Língua



como fruto roubado



que me liberta da longa noite



acumulada na boca.



Arde em mim a luz de fogo



que abre o mar e o peito



quando o sol se derrama e vai dormir.



Aqui



eu sinto bem dentro dos sentidos



o esplendor da água fervente



e dos corpos entontecidos



que só podem amar-se no ventre do mar.



Um vento leve com cheiro a maçãs



acaricia-me a face



trazendo pela mão a paz da tarde



e quase me adormece.



Perdi a página já não sei onde ia



também o sol se foi e com ele o dia.



Bate agora a noite com estrondo



no casco frágil da solidão.



Penso que tudo se vai desmoronar



talvez morrer



mas



de novo retomados



teus versos dizem-me que não.


 

 

 

Adão Cruz



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