"Po & Fu" - Arménio Vieira
Po & Fu
Há quem pense e diga
que escrever um poema
é como jogar uma bola
de futebol. Só que onze vates
é demais para um soneto,
além de que ninguém paga
para ver um poeta
enquanto escreve.
No futebol, mesmo quando
se erra no passe ou se falha
o golo, ganham-se milhões.
Se culpa houver, culpada é a
bola,
que se escusou de entrar.
Na poesia, quando calha
cortar a meta e vencer a prova
o que se ganha nem dá
para comprar um mísero osso
a ver se o cão se alegra
e
deixa o gato em paz.
No futebol, seguram-se
joelhos, canelas e coxas.
Na poesia, que seguradora
arriscaria
um cêntimo
por duas pestanas queimadas?
Entre
o remo e a rima,
parecença nenhuma.
Entre a bola e a poesia
uma
ténue analogia.
O futebol não é um hino
que se canta a solo.
É por excessivos dribles
que se perde o lance.
E por flamejantes gingas
que
se finta a relva.
Antes que o azul com que
escreves pouse no branco
da folha, começa a contar
e
continua contando até 666.
Posto isso, espera que o lobo
acabe de uivar. No minuto
seguinte,
afina os ouvidos
e
ouve: bzz! bzz! bzz! bzz!
Puxa!
Que vem a ser isso?
Uma vespa a zumbir?
Uma serpente a chiar?
Uma
torneira a pingar?
Finalmente o silêncio.
Tem calma, isto acaba
já.
Atenção! Escuta:
É por enfeitar os versos
com luxuosos brincos
que se borra a escrita.
E por vestir a musa
com preciosas sedas
que
se mata o poema.
Arménio Vieira
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