"PRIMEIRO DE MAIO" - Fernando Correia da Silva
PRIMEIRO DE MAIO
PRIMEIRO DE MAIO na vertical é
transformar o instinto em razão e esta naquele.
É conseguirmos ver o Invisível.
É usarmos infravermelhos para localizar
o MONSTRO agora diluído em estruturas canibais, omnipotência, omnipresença.
É sabermos detectar a tempo as suas
teias e evitar nelas pousar.
É rasgarmos as suas máscaras, sejam
elas lotes de ações ou abertura de caça ao preto e ao cigano.
É darmos valor à vida humana, em vez do
preço que ele pretende atribuir-lhe.
É sermos indiferentes à diferença entre
irmãos, homens que todos somos.
É não deixarmos que ele converta as
nossas vidas num andar solitário por entre a gente.
É não deixarmos que ele transforme os
homens em colônias de formigas.
É conseguirmos pôr no Soweto um
pianista japonês a emocionar a assistência com um noturno de Chopin.
É não deixarmos que tantos morram à
fome enquanto permanecem terras férteis em pousio e há trigo acumulado nos
celeiros.
É não consentirmos que as máquinas
tomadas pelo MONSTRO nos deixem com a alma em desarrimo.
É não deixarmos que ele transforme o
planeta em esgoto a céu aberto.
É não aceitarmos as gorjetas que ele
oferece para olharmos para o outro lado.
É não deixarmos que nos atire para a
lixeira.
É não consentirmos que o Direito
Comercial lace, aperte, esmague e devore os Direitos do Homem.
É arrimar-nos a um tronco largo quando
a jiboia ataca, comprimento ela não tem para laçar-nos juntamente com a árvore.
É puxarmos da catana e retalhá-la se
ela insistir no ataque.
É dinamitarmos a digestão antropofágica
do Labirinto.
É espantarmos os disciplinados cumpridores
de ordens, os bandos de corvos sempre à espera da sua quota-parte de carniça.
É ensinarmos as gaivotas a cagar na
cabeça de arrogantes e presunçosos.
É darmos um banho de lixívia aos
engravatados distribuidores de paninhos e água quente.
É cravarmos malaguetas no umbigo do Dr.
Prepotência, e outras, como flechas, no cu que o Dr. Banqueiro tem como cofre.
É nunca ficarmos de costas para os
traidores que há na vida.
É estarmos sempre atentos às manobras
do Piloto que elegemos.
É sabermos transformar as espadas em
arados e as metralhadoras em berbequins.
É levarmos os mansos a possuir a terra.
É consolarmos os que choram.
É saciarmos os que têm fome e sede de
justiça.
É acreditarmos que, embora Invisível,
será ainda possível empurrar o gênio do Santo Lucro para dentro da garrafa,
como outrora acreditamos que era possível vencer o Hitler, mesmo quando todos,
até os nossos filhos, garantiam que ele já era o rei do mundo.
Fernando Correia da Silva
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