"Soneto de áspera resignação" - David Mourão-Ferreira
Soneto de áspera resignação
Não me digas segredos nessa voz
em que dizes também o que não dizes.
Fica o silêncio ainda mais atroz
depois de entremostradas as raízes.
Prefiro que não digas nada, nada.
Que não sejas arbusto nem canção,
mas sombra entreaberta, recortada
por um lívido e breve coração.
Já que não podes dar-me o que eu sonhara
- inteireza de ramos e raiz -,
ao menos dá-me, intacta, a sombra clara
onde se esbatam vultos e perfis.
Pois nesta solidão melhor é ter
a sombra que um segredo de mulher.
David Mourão-Ferreira
em que dizes também o que não dizes.
Fica o silêncio ainda mais atroz
depois de entremostradas as raízes.
Prefiro que não digas nada, nada.
Que não sejas arbusto nem canção,
mas sombra entreaberta, recortada
por um lívido e breve coração.
Já que não podes dar-me o que eu sonhara
- inteireza de ramos e raiz -,
ao menos dá-me, intacta, a sombra clara
onde se esbatam vultos e perfis.
Pois nesta solidão melhor é ter
a sombra que um segredo de mulher.
David Mourão-Ferreira
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