O teatro do desoprimido e a catarse do cenário midiático
1
As sociedades humanas nada mais são que cenários teatrais produzidos por nós mesmos, num contexto em que somos tanto mais coadjuvantes quanto mais acreditamos em nossas próprias vidas, como se não fossem partes e contrapartes do teatro social no qual atuamos como personagens de nós mesmos.
2
Se a afirmação “o mundo é um teatro” é verdadeira o é porque nele atuamos como personagens que representam a si mesmos e, ao fazê-lo, atuam inevitavelmente como figurantes do cenário-mor: o teatro civilizacional que nos cabe viver, atuar, cumprindo à risca um script predeterminado quanto mais nos pensamos livres para escolher o mesmo, a saber: os objetos, sujeitos, valores, identidades, tecnologias, percepções, sensações, intelecções, saberes, amores, amigos, inimigos produzidos pelo próprio teatro civilizacional em que vivemos, para, antes de tudo, compor, ainda que de forma dinâmica, o seu cenário produtivo e simbólico, com seus sistemas de bens, com seus palcos institucionais e produtivos, nos quais atuamos como a gente mesmo, sendo efetivamente mero figurante, independente de nossa posição social, de vez que de uma forma ou de outra, mesmo como dissidentes, dependendo das circunstâncias históricas, com o passar do tempo somos igualmente transformados em ícones após sacrificados – ícones, bem entendido, do próprio cenário, da própria civilização, da própria farsa que somos.
3
Em América (1927), romance de Franz Kafka, o protagonista da narrativa, Karl Rossmann, foge de uma Alemanha decadente, após ter engravidado uma empregada, e parte clandestinamente para os Estados Unidos. Sem conseguir trabalhos na terra do Tio Sam, depara-se com um cartaz que diz: “No hipódromo de Clayton se contratará hoje desde as seis horas da manhã até a meia-noite, pessoal para o Teatro de Oklahoma. Chama-se o grande teatro de Oklahoma! (...) Este é o teatro que está em condições de empregar qualquer pessoa. Maldito seja aquele que não acredite em nós! Adiante, a Clayton! (Kafka, América, p.291)”. Diante de um cartaz tão apelativo, Karl não perde tempo, vai depressa para Clayton, onde tudo que você quiser ser você será. O grande teatro de Oklahoma, na ficção de Kafka, é a consciência ficcional de que América será doravante o teatro do mundo e de que a montagem da vida humana, a que chamamos de civilização, é cenário teatral onde atuamos para sermos o que quisermos, seja na realidade, seja em sonho, em desejo.
4
Chamemos de teatro dos figurantes ao Grande Teatro de Oklahoma, pois independente do papel que nele desempenhamos, em nossas vidas concretas, seremos sempre coadjuvantes de um cenário civilizacional previamente estabelecido. Chamemos a decadente civilização burguesa, da qual não passamos de meros figurantes, de o nosso Grande Teatro de Oklahoma; nela, tal como em Clayton, tudo que quisermos ser, seremos, num contexto em que sua teatral palavra de ordem é: “Maldito seja aquele que não acredite em nós!” Chamemos, por outro lado, de Teatro do Desoprimido a uma aberta, inacabada e experimental forma dramática cujo objetivo principal é: “Sejamos malditos, não acreditemos no Grande Teatro de Oklahoma da civilização burguesa!” Fujamos não de uma Europa em decadência rumo ao teatro burguês do momento, mas antes de tudo fujamos da civilização burguesa que fez de toda a Terra o cenário de nossa deplorável e submetida presunção de não figurantes, assim sendo mais ainda.
Para ler o texto completo de Luis Eustáquio Soares clique aqui
As sociedades humanas nada mais são que cenários teatrais produzidos por nós mesmos, num contexto em que somos tanto mais coadjuvantes quanto mais acreditamos em nossas próprias vidas, como se não fossem partes e contrapartes do teatro social no qual atuamos como personagens de nós mesmos.
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Se a afirmação “o mundo é um teatro” é verdadeira o é porque nele atuamos como personagens que representam a si mesmos e, ao fazê-lo, atuam inevitavelmente como figurantes do cenário-mor: o teatro civilizacional que nos cabe viver, atuar, cumprindo à risca um script predeterminado quanto mais nos pensamos livres para escolher o mesmo, a saber: os objetos, sujeitos, valores, identidades, tecnologias, percepções, sensações, intelecções, saberes, amores, amigos, inimigos produzidos pelo próprio teatro civilizacional em que vivemos, para, antes de tudo, compor, ainda que de forma dinâmica, o seu cenário produtivo e simbólico, com seus sistemas de bens, com seus palcos institucionais e produtivos, nos quais atuamos como a gente mesmo, sendo efetivamente mero figurante, independente de nossa posição social, de vez que de uma forma ou de outra, mesmo como dissidentes, dependendo das circunstâncias históricas, com o passar do tempo somos igualmente transformados em ícones após sacrificados – ícones, bem entendido, do próprio cenário, da própria civilização, da própria farsa que somos.
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Em América (1927), romance de Franz Kafka, o protagonista da narrativa, Karl Rossmann, foge de uma Alemanha decadente, após ter engravidado uma empregada, e parte clandestinamente para os Estados Unidos. Sem conseguir trabalhos na terra do Tio Sam, depara-se com um cartaz que diz: “No hipódromo de Clayton se contratará hoje desde as seis horas da manhã até a meia-noite, pessoal para o Teatro de Oklahoma. Chama-se o grande teatro de Oklahoma! (...) Este é o teatro que está em condições de empregar qualquer pessoa. Maldito seja aquele que não acredite em nós! Adiante, a Clayton! (Kafka, América, p.291)”. Diante de um cartaz tão apelativo, Karl não perde tempo, vai depressa para Clayton, onde tudo que você quiser ser você será. O grande teatro de Oklahoma, na ficção de Kafka, é a consciência ficcional de que América será doravante o teatro do mundo e de que a montagem da vida humana, a que chamamos de civilização, é cenário teatral onde atuamos para sermos o que quisermos, seja na realidade, seja em sonho, em desejo.
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Chamemos de teatro dos figurantes ao Grande Teatro de Oklahoma, pois independente do papel que nele desempenhamos, em nossas vidas concretas, seremos sempre coadjuvantes de um cenário civilizacional previamente estabelecido. Chamemos a decadente civilização burguesa, da qual não passamos de meros figurantes, de o nosso Grande Teatro de Oklahoma; nela, tal como em Clayton, tudo que quisermos ser, seremos, num contexto em que sua teatral palavra de ordem é: “Maldito seja aquele que não acredite em nós!” Chamemos, por outro lado, de Teatro do Desoprimido a uma aberta, inacabada e experimental forma dramática cujo objetivo principal é: “Sejamos malditos, não acreditemos no Grande Teatro de Oklahoma da civilização burguesa!” Fujamos não de uma Europa em decadência rumo ao teatro burguês do momento, mas antes de tudo fujamos da civilização burguesa que fez de toda a Terra o cenário de nossa deplorável e submetida presunção de não figurantes, assim sendo mais ainda.
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