"Um dia, sentarei na calçada" - Mahmoud Darwish
Um dia, sentarei na
calçada
Um dia
sentarei na calçada... na calçada de uma estranha.
Não terei
sido um narciso, embora eu defenda a minha imagem
nos
espelhos. Você já não esteve um dia aqui, estranho?
Quinhentos
anos se passaram, e a nossa separação ainda está incompleta,
as nossas
cartas não foram interrompidas, as guerras
não
modificaram os jardins de Granada. Um dia passarei por suas luas
e roçarei o
meu desejo num limão... Abrace-me para eu poder renascer
dos aromas
de um sol e de um rio sobre os seus ombros, e dos pés
que
arranham a tarde, e a tarde que chorará como leite para a noite do poema...
Não terei
sido um passante na palavra dos cantadores... eu seria
a própria
palavra dos cantadores, a paz de Atenas e Pérsia,
um Oriente
que abraça um Ocidente na partida rumo a uma essência única.
Abrace-me
para eu poder renascer das espadas damascenas nos mercados.
Nada sobrou
de mim além do escudo antigo e da cela dourada do meu cavalo.
Nada sobrou de mim além de um manuscrito de Averróis, o Colar da Pomba, e as
traduções...
Eu
costumava sentar na calçada da Praça Margarida
e contava
as pombas: uma, duas, trinta... contava as meninas
que
disputavam a sombra das árvores sobre o mármore,
e as folhas
da idade me abandonavam amarelas.
O outono
passou por mim, e eu não percebi,
todo o
outono passou, e a nossa história passou na calçada...
e eu não percebi!
Mahmoud Darwish
(Poeta palestino)
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