"Testamento" - Ruy Knopfli
Testamento
Se por acaso morrer durante o sono
não
quero que te preocupes inutilmente.
Será
apenas uma noite sucedendo-se
a
outra noite interminavelmente.
Se
a doença me tolher na cama
e a
morte aí me for buscar,
beija
Amor, com a força de quem ama,
estes
olhos cansados, no último instante.
Se,
pela triste monotonia do entardecer,
me
encontrarem estendido e morto,
quero
que me venhas ver
e
tocar o frio e sangue do corpo.
Se,
pelo contrário, morrer na guerra
e
ficar perdido no gelo de qualquer Coreia,
quero
que saibas, Amor, quero que saibas,
pelo
cérebro rebentado, pela seca veia,
pela
pólvora e pelas balas entranhadas
na
dura carne gelada,
que
morri sim, que me não repito,
mas
que ecoo inteiro na força do meu grito.
Ruy Knopfli
(Poeta moçambicano, 1932-1997)
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