sábado, 25 de novembro de 2023

"Paisagem" - Sophia de Mello Breyner Andresen

 



Paisagem




Passavam pelo ar aves repentinas,


O cheiro da terra era fundo e amargo,


E ao longe as cavalgadas do mar largo


Sacudiam na areia as suas crinas.



 

Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,


Era a carne das árvores elástica e dura,


Eram as gotas de sangue da resina


E as folhas em que a luz se descombina.



 

Eram os caminhos num ir lento,


Eram as mãos profundas do vento


Era o livre e luminoso chamamento


Da asa dos espaços fugitiva.



 

Eram os pinheirais onde o céu poisa,


Era o peso e era a cor de cada coisa,


A sua quietude, secretamente viva,


E a sua exalação afirmativa.



 

Era a verdade e a força do mar largo,


Cuja voz, quando se quebra, sobe,


Era o regresso sem fim e a claridade


Das praias onde a direito o vento corre.



 

Sophia de Mello Breyner Andresen

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