sexta-feira, 24 de novembro de 2017

"Acordo amor e sinto..." - Casimiro de Brito

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Acordo amor e sinto
uma chama levíssima na pele
no meu corpo que tanto bebeu
na funda chama a noite
inteira: e já te aproximas
tal como floresce
a maçã da manhã —
abro os olhos e fico dividido
entre a luz que invade o quarto
e a lâmpada matinal do teu corpo —
uma luz uma chama uma música lenta
que já me toca — vejo-te
com os olhos ainda fechados
quando os teus dedos pousam
nas minhas pálpebras e descem e tocam
na minha boca mas os teus lábios
tomam o seu lugar e roçam e são água
lenta
de uma língua que me converte
em sombra
visitada
por um cristal — mas não é uma lua
são duas
essas que em mim pousam: os teus seios
pássaros tão nus como as aves que prometem
uma terra limpa elevando-se inundando-me
de sal: são as dunas
do teu corpo que floresce
onde sou apenas um jovem animal
desprevenido. Os teus seios que sei
de cor — ah mas sempre neles canta
uma terra ignota. Os teus olhos que dizem
noli me tangere
deixa-me ser eu a tocar a entrar
no templo de ti deitado.
E sou, também eu, um templo
acordado por uma luz
mais alta. As tuas mãos desenham
no meu rosto
um halo, uma estrela macia
que de ti se levanta
e sobre mim cai. Andantina cai
onde sou mais verde e relva deitada
sou. E assim te moldas ao meu corpo
que se molda ao teu corpo: tua boca
descendo teus seios modelando
a escultura do meu chão. E já acordo. E já
me transformo
em pedra florida pelas tuas mãos
pela tua boca. O teu beijo
levanta-me — o teu beijo
eleva um sol que todo
te pertence. E colados estamos
mas ainda não somos
um só — um só corpo desenfreado
mas levemente ainda levemente
entrando na casa da sua irmã.


Casimiro de Brito

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