"Eterno" - Carlos Drummond de Andrade
Eterno
E como ficou chato
ser moderno.
Agora serei
eterno.
Eterno! Eterno!
O Padre Eterno,
a vida eterna,
o fogo eterno.
(Le silence
éternel de ces espaces infinis m'effraie.)
— O que é eterno,
Yayá Lindinha?
— Ingrato! é o
amor que te tenho.
Eternalidade
eternite eternaltivamente
eternuávamos
eternissíssimo
A cada instante se
criam novas categorias do eterno.
Eterna é a flor
que se fana
se soube florir
é o menino
recém-nascido
antes que lhe dêem
nome
e lhe comuniquem o
sentimento do efêmero
é o gesto de
enlaçar e beijar
na visita do amor
às almas
eterno é tudo
aquilo que vive uma fração de segundo
mas com tamanha
intensidade que se petrifica e
[nenhuma força o resgata
é minha mãe em mim
que a estou pensando
de tanto que a
perdi de não pensá-la
é o que se pensa
em nós se estamos loucos
é tudo que passou,
porque passou
é tudo que não
passa, pois não houve
eternas as
palavras, eternos os pensamentos; e
[passageiras as obras.
Eterno, mas até
quando? é esse marulho em nós de um
[mar profundo.
Naufragamos sem
praia; e na solidão dos botos
[afundamos.
É tentação a
vertigem; e também a pirueta dos ébrios.
Eternos! Eternos,
miseravelmente.
O relógio no pulso
é nosso confidente.
Mas eu não quero
ser senão eterno.
Que os séculos
apodreçam e não reste mais do que uma
[essência
ou nem isso.
E que eu
desapareça mas fique este chão varrido onde
[pousou uma sombra
e que não fique o
chão nem fique a sombra
mas que a precisão
urgente de ser eterno bóie como
[uma esponja no caos
e entre oceanos de
nada
gere um ritmo.
Carlos Drummond de Andrade
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