"Poema da perguntação" - Eduardo White
Poema da perguntação
Não
somos todos, os envergonhados, os verdadeiros culpados?
Não
somos nós, os indignados, os verdadeiros carrascos?
O
que antes e agora julgamos, não foi apenas uma pequena evidência? O que nós
prendemos não foi a mão obscura de uma consciência? E mesmo o que matamos, não
foi tão somente uma ínfima parte da verdade?
E
procuramos grades? E procuramos muros altos e seguros? E procuramos homens
obtusos para que os possamos vigiar? E procuramos armas para os tornarmos
intransponíveis? De nada nos valerá, de nada nos adiantará. Não há ferro, nem
betão, nem servilismo nenhum que nos possam salvar da luz da verdade.
Uma
mentira não tem sempre sede de liberdade? Uma mentira não é a cela da verdade?
E quantas vezes a pretendemos prender? E com quantas grades a desejamos
ocultar? E com quantas mãos a ameaçamos estrangular?
Não
vale a pena. Desistamos. Em nenhum maciço de betão podemos esconder o que a
nossa consciência sabe. Em nenhuma anedota, em nenhum boato, em nenhuma
suposição, em nenhuma imparcialidade e em nenhum juiz e em nenhum desmentido
nos jornais e em nenhum país. Nem de nós, nem dos outros.
Somos
todos nós os verdadeiros culpados, são nossos os muros e as grades onde
escondemos a verdade. E deles ninguém se evadiu, somos todos nós os verdadeiros
evadidos.
Eduardo
White
(Poeta moçambicano)
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