Racismo é a base para as políticas de imigração de Trump
27.jan.2017 - O presidente dos EUA, Donald Trump, assina a ordem executiva revisada
que impede a entrada de imigrantes de seis países de maioria muçulmana nos EUA
Racismo é a base para as políticas de imigração de Trump
Jamelle Bouie*
12/03/2017
Na segunda-feira, sem a
presença habitual de repórteres e fotógrafos, o presidente Donald Trump assinou
uma versão revisada e reduzida de sua agora infame proibição de entrada de
cidadãos e refugiados, comumente chamada de "proibição de
muçulmanos".
As mudanças em relação à original são
substanciais. O Iraque não está mais na lista de pontos de origem proibidos e o
governo também deixa claro que residentes permanentes legais e atuais
detentores de visto não estão impedidos segundo a nova versão.
Mas proíbe todos os refugiados de entrarem
nos Estados Unidos pelos próximos 120 dias, reduz o teto de admissão de
refugiados de 110 mil para 50 mil e abandonou a estipulação que dava prioridade
aos refugiados de "minorias religiosas do país de origem do
indivíduo", promovida como uma abertura para cristãos e considerada uma
das partes menos constitucionais da medida.
Mas como nota minha colega Dahlia Lithwick, ainda restam problemas sérios:
assim como a medida anterior, a ordem revisada não justifica a proibição de
pessoas da Síria, do Irã, da Líbia, da Somália, do Sudão e do Iêmen, os seis
países de maioria muçulmana ainda submetidos à proibição de entrada no país.
Na segunda-feira, em uma coletiva de
imprensa, o secretário de Justiça, Jeff Sessions, confirmou um relato de que
"mais de 300" casos do FBI (Birô Federal de Investigação, a polícia
federal americana) de terrorismo doméstico envolveram pessoas que entraram nos
Estados Unidos como refugiados. Mas não há prova (e o governo não fornece
evidência) de que os suspeitos vieram dos países listados, ou que os casos de
fato resultaram em condenações ou crimes de fato.
Na verdade, a alegação, uma parte integral
da ordem executiva (algo semelhante a uma medida provisória no Brasil)
revisada, vai contra uma análise por parte do Departamento de Segurança
Interna, que apontou que poucas pessoas dos países listados estiveram envolvidas
em terrorismo assim que pisaram em solo americano. E aquelas que se
radicalizaram o fizeram anos após sua chegada. Fora um exército de
precognitivos, uma triagem tem utilidade limitada.
Os termos da nova proibição podem impedir uma repetição das cenas trágicas (e
embaraçosas para o governo) que acompanharam a ordem original: residentes
legais sendo enviados de volta nos aeroportos, pais separados de filhos,
viajantes inocentes detidos e deportados sem nenhum motivo. Mas o que não faz é
proteger os americanos de qualquer ameaça em particular. Se você acha que a
ordem de viagem visa prevenir o terrorismo, então ainda é uma solução à procura
de um problema.
Mas há outra forma de ver a medida: como peça central de uma agenda enraizada
nas visões maniqueístas de seus principais autores, Stephen Miller e Stephen
Bannon. Tanto Miller quanto Bannon são claros a respeito da visão deles para os
Estados Unidos e francos sobre a visão deles do status quo.
Após a primeira proibição de viagem, o
"Los Angeles Times" noticiou que ambos os homens viam as medidas
anti-imigração do presidente como meios de combater o número crescente de
"residentes nascidos no exterior" provenientes de países não europeus
(isto é, não brancos). Natural da Califórnia, Miller há muito argumenta contra
a imigração latina, como sendo uma força que mina o tecido sociocultural do
país, definido implicitamente como branco e explicitamente como
"judeu-cristão".
Sua visão do islã é e sempre foi igualmente
clara. "Todos nós já ouvimos sobre quão pacífica e benigna é a religião
islâmica, mas não importa quantas vezes você diga isso, não muda o fato de que
milhões de radicais muçulmanos celebrariam sua morte pelo simples fato de você
ser cristão, judeu ou americano", ele escreveu como estudante colegial no
início dos anos 2000.
Igualmente, Bannon é um racista ideológico. É aparente seu apreço pelo
presidente Andrew Jackson, cujas principais "realizações" foram a
remoção forçada dos nativo-americanos em prol da "democracia do homem
branco", onde cidadania e seus privilégios eram reservados aos homens
brancos, independente de classe social.
É fácil ver isso em seu antigo cargo como
presidente-executivo da "Breitbart", onde transformou o site em um
paraíso online para antissemitas, nacionalistas brancos e outros elementos da
extrema direita. E é ilustrada por sua retórica ao longo de toda sua carreira.
O "Huffington Post" relata que
Bannon elogiou "O Campo dos Santos", um romance francês grotescamente
racista descrevendo um mundo onde a aparente invasão de refugiados indianos se
torna a vanguarda de um levante global de não brancos contra os brancos.
"A coisa toda na Europa é sobre
imigração", ele disse em janeiro de 2016. "Hoje é uma questão global,
esse tipo de Campo dos Santos global."
O livro, semelhante ao tratado supremacista branco "O Diário de
Turner" em sua descrição de uma guerra racial brutal, serve como alerta e
chamado às armas para os europeus brancos (e presumivelmente aos americanos
brancos), condenados como covardes e incompetentes por não terem matado os
imigrantes quando tiveram a chance.
Se essa é a posição dos autores da proibição de viagem, então não há mistério
sobre a motivação real para a ordem. Não terrorismo, do qual os refugiados e
viajantes desses países não são um vetor sério nos Estados Unidos, mas sim
nacionalismo étnico.
A proibição de viagem, assim como a
repentina explosão de deportação, empregada indiscriminadamente contra todos os
imigrantes sem documentos, "homens ruins" ou outros, é uma peça
do esforço maior para mudar a demografia do país à força. Visa separar aqueles
que pertencem daqueles que não (segundo Trump e seus apoiadores). Para
"tornar a América grande de novo" a tornando branca de novo, ou mais
precisamente, elevando a recompensa política de ser branco.
Enquanto navegamos pela corrupção, disfunção, fomentação de conspirações e
ataques contra o funcionamento do governo, devemos ter cuidado para não nos
esquecermos que também enfrentamos o radicalismo nacionalista branco do governo
Trump, ávido em fazer o tempo voltar para trás no pluralismo e na democracia
multirracial. Independente dos tribunais determinarem a legalidade
constitucional desta mais recente proibição de muçulmanos, esses fatos não
mudarão.
*Jamelle Bouie é correspondente política chefe da "Slate"
FONTE: Aqui
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