Escritor argentino Ricardo Piglia morre aos 75 em Buenos Aires
Escritor argentino Ricardo Piglia morre aos 75 em Buenos
Aires
SYLVIA COLOMBO
DE BUENOS AIRES
Morreu nesta sexta-feira (6), em Buenos Aires, Ricardo Piglia, aos
75 anos. Um dos mais importantes escritores argentinos contemporâneos, o autor
de "Dinheiro Queimado" e "Respiração Artificial", ambos
lançados no Brasil pela Companhia das Letras, padecia de esclerose lateral
amiotrófica (ELA) desde 2014. Segundo o jornal "Clarín", ele morreu
após uma parada cardíaca.
Nascido em Adrogué (Grande Buenos Aires), Piglia era um estudioso
da literatura argentina e, em seus livros, sempre estabelecia um diálogo entre
a atualidade e esse passado, fazendo referências a autores de outras épocas.
Desde que recebeu o diagnóstico da doença, passou a trabalhar de
modo acelerado em uma trilogia biográfica, assinada com o nome de seu alter
ego, Emilio Renzi.
A obra, em três tomos, chama-se "Diários de Emilio
Renzi". Os dois primeiros volumes foram lançados na Argentina e nos países
de língua hispânica entre 2015 e 2016: "Años de Formación" e
"Los Años Felices". Está no prelo, ainda, para publicação neste ano,
"Un Día en la Vida".
Também realizou recentemente um documentário, dirigido pelo
cineasta Andrés Di Tella, no qual relatava a experiência de abrir os cadernos
de anotações que escrevia desde a adolescência até a atualidade, enquanto
apontava para os momentos mais importantes de sua vida, em paralelo com as
várias fases da história argentina que os acompanharam.
Trechos desses cadernos foram publicados pela
"Ilustríssima" entre janeiro e junho de 2011 (leia o primeiro aqui ).
Na época em que "327 Cuadernos" foi lançado, em 2015, Di
Tella disse à Folha que Piglia tinha pressa em terminar o
trabalho. "Mesmo tendo alguns movimentos sendo restringidos pela doença,
ele seguia trabalhando, contratou assistentes, fez questão de ir até o
fim", contou.
Quando recebeu o diagnóstico, Piglia e a mulher, Beba Eguía, com
quem estava casado havia mais de 30 anos, tiveram um entrevero com o plano de
saúde do casal, que se recusou a pagar pelo tratamento com uma droga ainda em
experimento.
Vários intelectuais e amigos do mundo literário internacional
assinaram um abaixo-assinado, e uma grande campanha circulou pelos meios de
comunicação argentinos. O plano de saúde acabou cedendo e pagando o tratamento.
Meses depois, Eguía contou à Folha que o remédio vinha ajudando ao autor,
que havia podido retomar a escritura sem ter de ditar as frases para uma
secretária. Nos últimos meses, porém, sua condição deteriorou-se.
Piglia também exercia intensa atividade acadêmica. Durante muitos
anos, dividiu sua vida entre Buenos Aires e Princeton, nos EUA, onde dava aulas
de literatura latino-americana. O ambiente universitário o inspirou a escrever
"O Caminho de Ida", último romance lançado no Brasil.
CINEMA
Piglia ganhou projeção internacional com "Respiração
Artificial" (1980) e ficou ainda mais conhecido quando sua obra
"Dinheiro Queimado" foi levada às telas, em 2000, com direção de
Marcelo Piñeyro.
Recebeu prêmios literários como o Romulo Gallegos, e suas obras
estão traduzidas em mais de 15 idiomas.
Em sua última entrevista à Folha,
já doente, em 2015, Piglia falou sobre a experiência recente de abrir e reler
seus diários. Um dos momentos mais marcantes, contou ele, foi a passagem em que
conta como saiu da pequena cidade de Adrogué, porque o pai, peronista, havia se
metido em um conflito político com opositores.
"A viagem foi para mim uma travessia para o desterro. Eram
apenas 400 km até Mar Del Plata [onde a família se instalou, antes de se mudar
para Buenos Aires], mas eu estava deixando para trás toda uma forma de vida.
Foi um rito de passagem. Soa como um exagero, mas as experiências decisivas
surgem para nós como exageros. O que importa nos fatos é a intensidade que
atribuímos a eles", disse o autor.
FONTE: Aqui
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