Como o achismo torna ainda mais colorido o universo patético em que se move um determinado tipo de jornalismo
Como o
achismo torna ainda mais colorido o universo patético em que se move um
determinado tipo de jornalismo
José de
Sousa Miguel Lopes
Mão amiga fez-me chegar um texto intitulado “Espetáculo de Deltan Dallagnol só
serve à impunidade de Lula” de
um autor que desconhecia. E devo já penitenciar-me por isso. Com efeito, eu
estava lendo penosamente o texto quando duas frases me mostraram minha
insignificância sobre o que ocorre no mundo letrado do jornalismo. Como foi
possível eu não conhecer alguém que a cada texto que publica ou a cada momento
em que faz ouvir a sua voz, é capaz de provocar “A gritaria nas redes
sociais em razão do que escrevi no blog e afirmei no programa "Os Pingos
nos Is", na Jovem Pan, foi gigantesca”? O impacto que estas duas
frases provocaram em mim, foi indescritível. Fiquei encolhido, literalmente
reduzido à minha insignificância perante o gigantismo do autor que é capaz de
provocar abalos tsunâmicos de fazer inveja ao que ocorreu no Japão há pouco
mais de cinco anos. Estou supondo que estes abalos se restringem apenas ao
Brasil, embora não me custe admitir que possam abarcar também leitores à escala
planetária. Como posso, a partir de agora, olhar de frente para qualquer ser
humano, se eu não fui capaz de me alimentar das sábias reflexões deste gigante
das redes sociais?
Já na introdução de seu texto ele
faz um arrolamento de sua verticalidade moral e de sua enorme estatura ética.
Resgato alguns de seus considerandos auto avaliativos:
Comigo, ou as coisas são feitas segundo as regras do Estado
democrático e (atenção para o conectivo!) de Direito ou não servem. (...) Não
serão eles a definir as minhas escolhas. Eu as faço sem levar em conta o que
eles pensam. De resto, a minha profissão não é ser antipetista. Não sou
funcionário das obsessões alheias.
Como não ficar emocionado com
tamanhas provas de grandeza, num mundo tão carente de valores?
Continuei lendo e, mais adiante,
confirma-se que, além de sua estatura intelectual, ele continua mostrando aos
leitores a razão pela qual reúne em seu ser um “everest” de posturas éticas
assombrosas. Diz ele, “nosso” instigante jornalista, que “Sou funcionário
apenas das minhas convicções, ancoradas
em fatos. Aí, sim!” (...) “Não
vivo nem de vaia nem de aplauso”. Não é admirável? Quantos seres humanos
podem dar-se ao luxo de ter posturas éticas de tamanha magnitude?
Feita esta breve introdução,
imprescindível para que o leitor possa acolher sem reservas suas doutas
opiniões, pois que elas, ao fim e ao cabo, são resultantes de um longo e
laborioso processo de reflexão, faz-se necessário agora ir ao cerne de sua
análise. Que tema este sábio pensador se debruça para nos deleitar com sua
enorme capacidade reflexiva? Trata-se de um tema da atual situação política
brasileira, mais concretamente, relativo a uma denúncia feita pelo MPF (Ministério Público Federal) no
último dia 14 de setembro contra o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por corrupção
passiva e lavagem de dinheiro. Não irei debruçar-me especificamente sobre a
natureza desta operação midiática, mas apenas centrar-me no texto de “nosso”
jornalista de plantão.
Ele critica a atuação
do MPF, porque em sua opinião foi um “show, um
espetáculo que repudia por considera-lo contraproducente” (...) tornam nebulosas as razões
que justificam a acusação de lavagem de dinheiro (...) estranha entrevista
coletiva. E aproveita para
postar algumas pérolas produzidas nesse espetáculo, acabando por concluir que “Essas
são apenas algumas das passagens em que a precipitação e o gosto pelo
espetáculo confundem a denúncia de cometimento de crimes com responsabilização
objetiva”. Traduzindo: as
denúncias não apresentam fatos objetivos!
Não é difícil concordar com este posicionamento que, aliás,
reforça o que o autor já tinha dito no início do seu texto “Sou funcionário
apenas das minhas convicções, ancoradas em fatos”.
E termina acariciando de forma
afetuosa os seus inúmeros leitores ao afirmar “Os
cretinos acham que estou afirmando que Lula é inocente. Não! Eu acho que ele é
culpado. O que estou sustentando é que a denúncia é inepta e que a
força-tarefa, com o seu gosto pela ribalta, prestou um favor imenso à defesa do
ex-presidente”.
E agora, de forma convincente, o
jornalista apresenta em seu artigo os fatos que comprovam as denúncias contra o
ex-presidente. Eis os fatos indesmentíveis apresentados:
“Acho (sic) que Lula, com
efeito, é o chefe do petrolão. Acho (sic) que ele era o chefe do mensalão. Na
verdade, há 15 anos escrevo que o considero (sic) o chefe de um esquema para
assaltar a institucionalidade”. Como se vê, aqui estão as provas
contundentes que o autor, de forma brilhante, nos apresenta, baseando-se nesse
conceito bastante operativo chamado “achismo”. Basta achar e tudo fica provado.
Isto é elementar, meu caro Watson!
Resumo da ópera: o articulista
afirma com todas as letras e amparado, como vimos, na sua enorme verticalidade
moral, que só aceita fatos e não achismos. Eu poderei dizer que Papai Noel e
Saci Pererê, com acabei de falar, têm uma opinião distinta da do “nosso”
articulista. E ele dirá que não acredita na existência desses seres e que
precisa de provas, fatos que demonstrem sua existência. Pois eu acho que eles
existem e não preciso de fatos. Basta eu achar.
Se alguém no MPF acha, se o jornalista
acha, porque razão eu não tenho também o direito de achar? Vivemos num Estado
de Direito onde a democracia é um valor inquestionável. Eu acho que o fato de
Papai Noel e Saci Pererê existirem está sustentado pela prova dos fatos. E
desde menino que ouço que “contra fatos não há argumentos”. Então como dizia um
famoso personagem da TV brasileira “Não me venha com churumelas!”
O jornalista foi uma vítima de
seu patético discurso. Aquilo que ele condena é exatamente o que ele usa com o
maior despudor e “inocência”. Se isto não é viver num mundo patético, é o quê?
Mas fechemos com chave de ouro, estas minhas considerações. E nada melhor que
pedir apoio ao nosso instigante jornalista, pois ele fecha seu texto com esta
preciosidade “Se a Procuradoria-Geral da República não botar ordem na
bagunça, o resultado será a impunidade”. E
atrevo-me a pedir apoio a quem de direito para que não impeça que textos
coloridos e patéticos como o de nosso articulista continuem a tornar nossa vida
mais suportável e encantadora
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