"Ocasos acidentais" - Al Berto
Ocasos acidentais
é tarde meu amor
estou longe de ti
com o tempo, diluíste-te nas veias das marés, na saliva de meu corpo sofrido
agora, tuas
máquinas trituram-me, cospem-me, interrompem o sono
habito longe, no
coração vivo das areias, no cuspo límpido dos corais… e no ventre impossível
das cidades noturnas
a solidão tem dias
mais cruéis
tentei ser teu,
amar-te e amar o falso outro… quis ser grande e morrer contigo
enfeitar-me com as
tuas luas brancas, pratear a voz em tuas águas de seda… cantar-te os gestos com
ternura
mas não
águas, águas
inquinadas pulsando dentro de meu corpo, como um peixe ferido, louco
em mim a lama… e o visco inocente dos teus náufragos sem nome-de-rua, nem estátua-de-jardim-público
em mim a lama… e o visco inocente dos teus náufragos sem nome-de-rua, nem estátua-de-jardim-público
aceito o desafio do
teu desdém
na boca ficou-me um
gosto a salmoura e destruição
apenas possuo o
corpo magoado destas poucas palavras tristes que te cantam
Al Berto
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