Documentário explora diferenças entre obras de Visconti e Fellini
Documentário explora diferenças entre obras de
Visconti e Fellini
Inácio Araujo
28/02/2018
Cineastas trazem inscritas em suas obras as marcas das diferentes
origens sociais
·
· Face a face - Visconti vs.
Fellini, duelo à italiana (Duels)
· Onde na Netflix
· Produção França,
2014
· Direção Christopher Jones, Marie-Dominique Montel
Para a série francesa
"Face a Face" parece que as rivalidades movem o mundo: Sartre vs.
Camus, Bill Gates vs. Steve Jobs, Chanel vs. Schiaparelli. É como se o mundo
fosse uma imensa luta de boxe. O que não a impede de ter momentos de interesse
e mesmo reveladores, como no caso da dupla Fellini/Visconti.
Além de representarem com
brilho a época de ouro do cinema italiano, Luchino Visconti e Federico Fellini
trazem inscritas em suas obras as marcas das diferentes origens sociais.
Visconti cresceu como aristocrata refinado. Um dos palácios da família ficava
ao lado do Scala de Milão, onde não raro grandes artistas eram recebidos pelo
pai as récitas.
Fellini vinha de uma família pobre e tinha como pai um caixeiro
viajante. Como bem se nota na série: a realidade de um era a ópera, a do outro,
o circo. Embora Visconti fosse bem mais velho, destacam-se com grandes sucessos
no início dos anos 1950. Nesse tempo, diga-se, Rossellini já não era
Rossellini, e Antonioni ainda não era Antonioni.
A coincidência de realizarem dois grandes filmes ao mesmo tempo
(Visconti, "Sedução da Carne", Fellini, "A Estrada da
Vida"), ambos com êxito de público e crítica, ajudou a colocar as
respectivas cortes em ação. A imprensa se encarregaria do resto: transformar a
disputa entre os dois filmes numa rixa pessoal.
O temperamento, o ego
imenso e as diferenças entre o riminiano (Fellini) e o milanês (Visconti)
completaram o serviço. No meio, a divisão entre técnicos. O primeiro trouxe
para si a música de Nino Rota, da qual seu cinema tornou-se indissociável. E o
segundo foi buscá-lo para "O Leopardo".
Em compensação, foi
Visconti quem descobriu a arte do diretor de fotografia Giuseppe Rotunno (um
grande mérito do episódio é comentar e ilustrar a última sequência de
"Sedução da Carne", confiada a Rotunno, um dos grandes cinegrafistas
da história do cinema), frequente nos sets fellinianos desde
"Satyricon", já no final dos anos 1960. Na mesma época, Visconti
voltava-se a outro fotógrafo da mitologia cinematográfica: Pasqualino de
Santis.
É uma pena que o episódio
não se detenha no que tais técnicos trouxeram ao cinema desses dois cineastas.
Em troca, existem informações muito interessantes sobre o espírito no set
desses dois senhores cineastas. Visconti levava para lá um espírito de ordem,
mas também de autoridade: era um nobre falando a seus vassalos. No estúdio de
Fellini vigorava a anarquia.
É bem forte a experiência que uma estrela, Claudia Cardinale,
tem ao ser compartilhada, ao mesmo tempo, pelos dois diretores. Ao mesmo tempo
em que Visconti rodava "O Leopardo", Fellini fazia "8 ½".
Momentos centrais na obra dos dois artistas, porém que indicam, igualmente, a
radical distância entre eles: o pendor viscontiano obsessivamente realista, por
um lado, e a proximidade felliniana entre o cinema e o sonho.
"Face a Face"
patina no terreno da fofoca, mas faz dele um belo ponto de partida para
esclarecer a distância entre os trabalhos de ambos.
É o que faz desse
documentário francês (com cara às vezes tão americana) uma experiência bem
interessante de introdução a uma época, a uma cinematografia, a um país e, por
fim, claro, a duas obras fundamentais do cinema.
FONTE: Aqui
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