Mostra pelos 50 anos de 'Persona' é passeio extraordinário por Bergman
Mostra pelos 50 anos de
'Persona' é passeio extraordinário por Bergman
SÉRGIO RIZZO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
18/10/2016
À luz do entardecer de um domingo de
verão, cerca de 30 felizardos acompanham, em uma praia rochosa, as atrizes
Sofia Pekkari e Nina Zanjani interpretarem um trecho da peça "Deformed
Persona" (Persona deformada).
"Tento me dividir em
duas", diz uma delas. "Tento pensar em corpo e alma, carne e ar,
tentando realmente, sinceramente, observar a mim mesma do lado de fora, de
cima."
Realizada em homenagem aos 50 anos
do lançamento de "Persona", a performance encerrou, em 3 de julho, a
Bergmanveckan (Semana Bergman, o evento anual dedicado ao cineasta e organizado
pelo Bergmancenter) de 2016.
Não haveria lugar melhor para a
celebração: o trecho de praia da ilha de Fårö (Suécia) onde o filme foi rodado,
em 1965, a poucos metros do local que mais tarde Bergman escolheria para viver
e morrer.
Parte das homenagens à obra-prima do
diretor sueco chega a São Paulo na programação da 40ª Mostra Internacional de
Cinema, com a exposição "Por Trás da Máscara - 50 Anos de Persona" e
a exibição de cópia digital restaurada do filme, na quinta (20), ambas no Itaú
Cultural.
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5 CURIOSIDADES SOBRE A OBRA
Gênesis: Bergman disse que a liberdade de 'Persona'
salvou a sua vida, pois o cargo que tinha então no Teatro Real Sueco lhe
parecia uma prisão
Roteiro com anotações: 'Kinematograph' era o título de 'Persona'. As
páginas expostas na mostra estão em sueco; alguns trechos foram traduzidos para
o português
'O' livro: 'O Herói do Nosso Tempo', de Liérmontov, é
mostrado no prólogo de 'Persona' e já estava, assim como o garoto que o lê, em
'O Silêncio'
Strindberg: Bergman dirigiu quatro montagens de 'O Sonho',
de Strindberg (1849-1912), cujo prefácio parece tratar do próprio 'Persona'
Sófocles: A personagem de Liv Ullmann emudece durante
apresentação de 'Electra', em uma variação do luto vivido pela protagonista da
peça
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Poucos filmes em 120 anos de cinema
renderiam uma exploração vertical (e sensorial) como a que faz a exposição, com
curadoria e concepção artística (100% brasileira) de Helen Beltrame-Linné,
diretora do Bergmancenter desde 2014, e Murilo Hauser.
A versão paulistana é ligeiramente
maior do que a de Fårö, cobrindo desde as origens do projeto até as referências
para as quais "Persona" aponta. Para admiradores de Bergman, é um
passeio extraordinário pelo seu universo temático e formal.
Apesar disso, também não consegue (e
alguém conseguiria?) esgotar o filme. Ao contrário, e melhor: abre janelas para
campos de observação e interpretação que o espectador pode explorar na próxima
vez em que voltar a ele.
Os jovens diretores da nouvelle
vague e de outros cinemas novos dos anos 1960 lideravam a cena autoral quando
Bergman ensaiou, na acepção mais experimental do termo, uma pequena fuga
moderna a suas próprias convenções.
Em "Persona", ele se
distanciou do registro estético que o havia consagrado em filmes como
"Morangos Silvestres" (1957) e "O Sétimo Selo" (1957), ao
mesmo tempo em que continuou a abordar seus grandes temas.
Uma espécie de "Bergman
2.0", que encafifou e seduziu muitos com sua aura simbólica. Filme-enigma
que convida a "decifrá-lo", mas com espaço para análises, devido às
múltiplas portas de entrada.
Há uma atriz veterana que emudece
durante uma apresentação de "Electra" (Liv Ullmann) e uma jovem
enfermeira encarregada de seus cuidados (Bibi Andersson). Mas há também as
imagens antológicas da sequência de créditos e do prólogo, algumas das quais
retornam.
No Brasil, foi lançado com o título
"Quando Duas Mulheres Pecam". Não é uma leitura só moralista, o que
combina com a atual onda reacionária no país, mas redutoramente tola.
Mercadologicamente oportunista, sem dúvida.
"Minha concepção fundamental é
justamente não ter concepção fundamental", disse Bergman em 1968.
"Minhas ideia sobre a vida, que eram extremamente dogmáticas no começo, se
tornaram mais flexíveis pouco a pouco. Hoje elas não existem mais, não são mais
as mesmas."
"Persona" traduz um
artista fenomenal não mais no verão de suas certezas, mas no outono de suas
dúvidas.
POR TRÁS DA MÁSCARA
Onde: Itaú Cultural, av.
Paulista, 149, tel. (11) 2168-1777
Quando: ter. a sex., das
9h às 20h; sáb., dom. e fer.; das 11h às 20h; até 6/11
Quanto: grátis
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