PEC 241 e o cinto de castidade
PEC
241 e o cinto de castidade
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE*
30/11/2016
Em 2007, o
pesquisador alemão Albrecht Classen publicou seu pequeno tratado "O Cinto
de Castidade Medieval: um Processo de Produção do Mito", em que desmonta a
crença de que este aparelho fora extensivamente usado na Idade Média ou durante
o Renascimento.
Todavia, se o
mito existiu e foi, a partir do século 15, tão ridicularizado pelos
intelectuais de então, é porque era uma ameaça.
O que nessas
discussões históricas se esquece é que o cinto de castidade é uma realidade
atual. O jornal "The Guardian" avalia em 30 mil os mancebos que usam
voluntariamente esse aparato, hoje, na Inglaterra.
Trata-se de
mais uma forma de fetiche, tais como o autoflagelo de jovens da Opus Dei, a
clausura de Monges Trapistas e Carmelitas, os eremitas de Meteora etc.
A PEC 241
parece estar dentro dessa mesma categoria de anomalias. O governo impõe a si
mesmo restrições quanto a decisões importantes para o futuro da nação. Ou seja,
restringe a capacidade de decidir. Uma espécie de autocastração.
Limitar por 20
anos a própria autonomia equivale a escolher o autismo administrativo, pela
inércia cerebral. As consequências são as mais nefastas possíveis.
Tomemos como
exemplo a atividade de pesquisas científicas. O Brasil atribui, hoje, 1,2% do
seu PIB ao setor de ciência e tecnologia, enquanto países industrializados e
emergentes reservam entre 2,5 e 3,5%, por exemplo.
Há um consenso
universal, exceto talvez entre monetaristas, uma outra forma de anomalia, de
que sem apreciável atividade em ciência e tecnologia não há sobrevivência
econômica para uma nação.
Pois bem, a PEC
241 decreta não só a estagnação da pesquisa no Brasil mas também o seu
extermínio progressivo.
O Ministério de
Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação teve entre 2015 e 2016 um corte de
42% de seu orçamento, o que não será compensado em 2017. Ora, dirão os
defensores da PEC, é sempre possível transferir recursos de um ministério para
outro.
Pois bem,
tiramos da depauperada Educação, ou talvez da moribunda Saúde? O voraz
Congresso Nacional, certamente, não deixaria mexer nas verbas dos ministérios
das Cidades, da Integração etc.
Em conclusão, a
PEC 241 condena à estagnação não apenas a ciência, a educação e a saúde mas a
própria nação.
Deve ser o
único caso da história em que um país, voluntariamente, escolhe a própria ruína
e compromete o seu futuro para aparentar -repito, aparentar- virtude, como se
fazia com o uso de cintos de castidade na Idade Média.
*Físico, é professor
emérito da Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do
Conselho Editorial da Folha.
FONTE:
Aqui
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