Heterobiografia e Artes Visuais: a estreia de Paulo Faria
A obra de estreia de Paulo Faria, Estranha Guerra de Uso Comum, é um romance híbrido com um ímpeto invulgar no desenvolvimento dos gêneros que toca. Até agora conhecido pelas suas excelentes traduções de grandes romancistas de língua inglesa, contemporâneos (Cormac McCarthy, Don DeLillo) e clássicos (Dickens, Orwell), Paulo Faria escolhe para tema autoral a revisitação da guerra colonial que, não tendo vivido, reconhece como um momento de radical mudança para um pai a quem fez poucas perguntas e com o qual se quer agora confrontar, juntamente com seus demônios entrincheirados. Com esta premissa se tece uma espécie de ficcionalização heterobiográfica: ficção porque, embora o autor e narrador tenham circunstâncias comuns, como serem tradutores e filhos de pais médicos que serviram como oficiais milicianos em Moçambique, a distância dos nomes e episódios reduz porventura os danos colaterais da autodescoberta, ajudando a manter o enredo livre de pressões; heterobiográfico porque não só o narrador se projeta na vida paterna como a reconstrução desta aparece afinal refratada pelas histórias de vários camaradas de campanha do pai, ocupando a voz de cada um deles um capítulo desta obra. São, ao todo, dez depoimentos, com modos distintos de caracterização discursiva, atestando porventura o bom ouvido do tradutor. Com estas dez vozes, aliando o romance de investigação, ou ficção documental, ao gênero memorialista, alternam capítulos reflexivos onde o sujeito se desvenda, no presente suspenso do luto.
Para ler o texto completo de Margarida Vale de Gato clique aqui
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