sábado, 24 de março de 2018

"Acordo amor e sinto" - Casimiro de Brito

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Acordo amor e sinto
uma chama levíssima na pele
no meu corpo que tanto bebeu
na funda chama a noite
inteira: e já te aproximas
tal como floresce
a maçã da manhã —
abro os olhos e fico dividido
entre a luz que invade o quarto
e a lâmpada crucial do teu corpo —
uma luz uma chama uma música lenta
que já me toca — vejo-te
com os olhos ainda fechados
quando os teus dedos pousam
nas minhas pálpebras e descem e tocam
na minha boca mas os teus lábios
tomam o seu lugar e roçam e são água
lenta
de uma língua que me converte
em sombra
visitada
por um cristal — mas não é uma lua
são duas
essas que em mim pousam: os teus seios
pássaros tão nus como as aves que prometem
uma terra limpa elevando-se inundando-me
de sal: são as dunas
do teu corpo que floresce
onde sou apenas um jovem animal
desprevenido. Os teus seios que sei
de cor — ah mas sempre neles canta
uma terra ignota. Os teus olhos que dizem
noli me tangere
deixa-me ser eu a tocar a entrar
no templo de ti deitado.
Um templo acordado por uma luz
mais alta. As tuas mãos desenham
no meu rosto
um halo, uma estrela macia
que de ti se levanta
e sobre mim cai. Andantina cai
onde sou mais verde e relva deitada
sou. E assim te moldas ao meu corpo
que se molda ao teu corpo: tua boca
descendo teus seios modelando
a escultura do meu chão. E já acordo. E já
me transformo
em pedra florida pelas tuas mãos
pela tua boca. O teu beijo
levanta-me — o teu beijo
eleva um sol que todo
te pertence. E colados estamos
mas ainda não somos

um só — um só corpo desenfreado
mas levemente lentamente entrando
na casa da sua irmã.


Casimiro de Brito

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