domingo, 22 de outubro de 2023

"Queria um país de Sol para te dar" - Carlos Loures


 


Queria um país de Sol para te dar

 

 




Queria um país de Sol para te dar,


com amantes e crianças nos jardins,


pássaros livres a cantar nas árvores


e a luz em liberdade pelas ruas


– as coisas nos lugares onde as sonhámos


e não nos sítios onde estão,


com armas aperradas a guardá-las.


Um país onde sulcássemos as límpidas manhãs


com sorrisos claros vestindo as faces.


Um país sem muros, sem medo


nem carimbos nas cartas que escrevemos


e ouvidos nas palavras que dizemos,


em segredo.


Mas, meu amor, nascemos cedo,


chegámos ainda a tempo de viver


este tempo que vivemos


com lágrimas ocultas no sorriso,


a raiva escondida nas carícias


e uma secreta esperança aprisionada


nos nossos corações aprisionados.


Viemos ainda a tempo de sofrer


Este tempo que sofremos


dia a dia e que sulcamos,


com os beijos vigiados,


com os nossos segredos desvendados,


com este amor amputado e prisioneiro


com que amamos.


Meu amor, não desertemos


Do tempo e do país em que nascemos


(e viver outro tempo dentro deste


ou estar fora do país


dele não saindo,


também é desertar).


Já que foi este o tempo que nos coube,


já que foi este o país que nos deixaram,


temos de conquistar o Sol que os ilumine,


roubando-o ao silêncio e à mordaça


que nos sufoca a voz – Não desertamos


– o ódio, o medo, a morte


que fujam, que desertem


se o amor os insulta e ameaça.


– Nós ficamos!


Com ao companheiros


e o amor dos companheiros,


o amor será mais forte


do que o ódio, do que o medo, do que a morte.


A luz também se constrói com os nossos beijos,


com as palavras clandestinas que escrevemos,


aquelas que a opressão não vê nem ouve.


A luz também se constrói com os nossos filhos,


eles tingem de luz nova


as sombras que com ódio vêm pôr


entre as carícias, os beijos e as palavras.


Neles se erguerá a luz para amanhã


e a liberdade prisioneira nos nossos corações


inundará de Sol as ruas,


meu amor.



 

 

Carlos Loures


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