sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

"Mas um velho, de aspeito venerando..." - Luís de Camões


 


Mas um velho, de aspeito venerando...

 




Mas um velho, de aspeito venerando, (= aspecto)


Que ficava nas praias, entre a gente,


Postos em nós os olhos, meneando


Três vezes a cabeça, descontente,


A voz pesada um pouco alevantando,


Que nós no mar ouvimos claramente,


C’um saber só de experiências feito,


Tais palavras tirou do experto peito:


Ó glória de mandar, ó vã cobiça


Desta vaidade a quem chamamos Fama!


Ó fraudulento gosto, que se atiça


C’uma aura popular, que honra se chama!


Que castigo tamanho e que justiça


Fazes no peito vão que muito te ama!


Que mortes, que perigos, que tormentas,


Que crueldades neles experimentas!


Dura inquietação d’alma e da vida


Fonte de desamparos e adultérios,


Sagaz consumidora conhecida


De fazendas, de reinos e de impérios!


Chamam-te ilustre, chamam-te subida,


Sendo digna de infames vitupérios;


Chamam-te Fama e Glória soberana,


Nomes com quem se o povo néscio engana.”


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Luís de Camões


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