terça-feira, 5 de abril de 2022

"Crónica feminina" - Vasco Graça Moura

  





Crónica feminina

 

 



 

 

estava nua, só um colar lhe dava


horizontes de incêndio sobre o peito,


a transmutar, num halo insatisfeito,


a rosa de rubis em quente lava.



 
estava nua e branca num estreito


lençol que o fim do sono desdobrava


e a noite era mais livre e a lua escrava


e o mais breve pretérito imperfeito



 
só o tempo verbal lhe fugiria,


no alongar dos gestos e requebros,


junto do espelho quando as aves vão.



 
toda a nudez, toda a nudez, toda a melancolia


a dor no mundo, a deslembrança, a febre, os


olhos rasos de água e solidão

 

 



 

 

 

Vasco Graça Moura

 

 



 

 

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