sábado, 11 de janeiro de 2020

Rui Costa Pimenta sobre conflito EUA x Irã: não é uma guerra ideológica, e sim de império contra escravos

Rui Costa Pimenta e Donald Trump

Para o presidente do PCO, é preciso que o Brasil e as forças progressistas se coloquem ao lado do Irã, em apoio contra o império dos Estados Unidos. “Não é uma luta entre o cristianismo e o islamismo, entre a democracia e uma ditadura, entre o mundo livre do Ocidente e o mundo não livre do Oriente. O que temos aqui é um país imperial que controla o mundo, uma potência opressora como o mundo nunca viu. Esse é o conflito”, disse. 
Para ler o texto de Rui Costa Pimenta clique aqui

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A idiotice do Trump matou 176 inocentes


Andrew Fishman


The Intercept-Brasil - 11/01/2020




Enquanto a gente estava tentando esquecer do mundo um pouco durante a virada do ano, os EUA e Irã chegaram até a beira de uma guerra. Nas duas últimas semanas, o mundo assistiu à trocas de agressões dramáticas –  mas esse conflito não começou agora. E também não morreu quando Trump disse que "está tudo bem" no Twitter após a saraivada de mísseis que o Irã lançou em uma base militar dos EUA no Iraque.

Não está tudo bem. Mesmo se a guerra não acontecer, danos sérios já foram feitos. Na quinta-feira, foi divulgado um vídeo que aparentemente mostra o voo 752 da Ukraine International Airlines sendo atingindo por um míssil. O avião caiu em Teerã horas depois dos ataques do Irã à bases militares americanas. Agências de inteligência dos EUA e Canadá acreditam que o Irã atirou no avião acidentalmente, confundindo-o com um ataque americano. O Irã nega. De qualquer jeito, um acidente desse nunca teria acontecido se Trump não tivesse decidido de brincar de guerra. Pelo menos 176 pessoas inocentes estão mortas agora por causa dele.

Como eu sou dos EUA, meus colegas do Intercept Brasil queriam saber o que eu estava pensando sobre tudo isso e pediram que eu escrevesse essa newsletter para compartilhar alguns dos pontos mais importantes desse conflito, e (quase) tudo o que você precisa saber para entender os próximos passos.

Mas antes, vou resumir rapidamente os últimos acontecimentos para nós ficarmos na mesma página:

• 27 de dez – Uma milícia pró-Irã lança mais de 30 foguetes em uma base militar americana/iraquiana no Iraque e mata cidadãos dos dois países;

• 29 de dez – Os EUA bombardearam as milícias pró-Irã no Iraque e matam 24 pessoas;
• 31 de dez – Milicianos e manifestantes atacam a embaixada americana em Bagdá, que fica sitiada por quase um dia;
• 3 de jan – Um drone americano mata o general iraniano Qassim Suleimani e líderes de milícias pró-Irã. Suleimani era o 2º político mais importante do país;
• 8 de jan – O Irã lança aproximadamente 20 foguetes contra duas bases militares dos EUA e Iraque. Ninguém morreu;
• 8 de jan – Voo 752 da Ukraine International Airlines cai perto de Teerã, matando todos os 176 passageiros;
• 8 de jan – Em discurso, Donald Trump sinaliza uma desescalada no conflito. "O Irã parece estar abandonando sua postura [de agressão]. O que é bom para todas as partes envolvidas", ele disse, completando: "o povo americano deve estar extremamente grato e feliz".

Agora, o que você precisa saber sobre isso?

1. Os americanos são desequilibrados

Os EUA mostraram que são impulsivos, incoerentes, criminalmente agressivos e não têm conhecimento sobre o cenário. Na sua campanha de 2016, Trump prometeu retirar os EUA das "guerras eternas" do Oriente Médio. Fez o contrário: com o assassinato do Suleimani, arriscou criar mais uma (e contra seu adversário mais poderoso da região). Além disso, analistas concordam que o ataque foi ilegal e criou precedentes perigosos.

Enquanto isso, o Irã foi razoável, estratégico e inteligente — mesmo sendo, às vezes, brutal. Essa descrição vale para agora, mas também é verdade desde 2001.

2. O Irã não quer guerra

O Irã não quer uma guerra com os EUA. Nunca quis. Você não precisa concordar com as aiatolás para reconhecer que eles são mestres na arte de auto-preservação. Eles sabem que uma guerra com o maior exército do mundo significaria a destruição do seu país e o fim do seu governo.

O Irã condenou os ataques de 11 de setembro de 2001 como atos terroristas e ajudou os EUA para derrotar a al Qaeda. Mas o governo Bush estava delirante com o desejo de refazer o mapa do Oriente Médio (e a equipe focada nisso, por acaso, estava fazendo reuniões clandestinas com executivos de petroleiras). Os americanos não apenas recusaram a oferta, como logo depois declararam que o Irã, junto com Coreia do Norte e seu inimigo Iraque, fazia parte do "Eixo do Mal". Até agora não existe um pingo de evidência que qualquer desses países tenha algo a ver com 11 de setembro ou al Qaeda.

Depois do atentado, os americanos rapidamente invadiram o Afeganistão (vizinho do Irã) sob o pretexto de acabar com al Qaeda. Mas antes mesmo disso, eles já começaram a traçar planos para invadir o Iraque (também vizinho do Irã), estabelecer um novo governo lá em alguns meses e, logo depois, partir para uma terceira invasão: Irã.

Os aiatolás, com Suleimani servindo como seu escudo, adotaram uma estratégia defensiva. Eles bagunçaram os planos dos americanos na Afeganistão e no Iraque para que eles nunca chegassem a executar a última fase do plano. Funcionou. Agora só falta o último objetivo: tirar as tropas americanas da região.

3. Trump é 100% responsável

A nova vida política do Trump começou com ele ganhando atenção por argumentar (sem nenhuma prova) que Obama não deve ter nascido nos EUA e deveria apresentar sua certidão de nascimento. Racismo que chama. A campanha presidencial do Trump foi basicamente uma campanha anti-Obama: se Obama fez deve ser ruim. Como a principal conquista dele foi o acordo nuclear com Irã — fruto de uma longa negociação que abriu o caminho para relações normais com o país que Bush demonizou em 2001 –, Trump prometeu rasgar o acordo. Fez isso em maio de 2018.

Desde então, a relação bilateral degringolou: sanções econômicas, troca de ameaças, uma série de incidências diplomáticas e militares, um bombardeio do Irã que Trump cancelou no último minuto. Nada disso teria acontecido se Trump não tivesse saído do acordo. Mesmo assim, o Irã continuou respeitando os termos – isso só mudou depois do assassinato do Suleimani, quando avisou que recomeçaria o enriquecimento nuclear mas continuaria permitindo inspecções.

4. A resposta do Irã foi perfeita

O Irã elaborou 13 opções de planos para vingar a morte do Suleimani. Decidiram lançar mísseis exatamente nas bases que foram usadas para atacar suas forças, um ato dentro do direito de resposta previsto na lei internacional. Foi um retruque claro e lógico.

Como a base é usada pelos americanos e os iraquianos — que são aliados próximos do Irã –, eles tinham a obrigação de avisar o governo do Iraque antecipadamente. O Iraque, por sua vez, tinha a obrigação de avisar os seus aliados, os americanos. O Irã não podia avisar os americanos diretamente sem parecer fraco, mas ao mesmo tempo não queria matar ninguém porque seria uma provocação que Trump teria que responder.

Usaram mísseis cirúrgicos: ninguém foi morto. Mas, na imprensa iraniana, o governo afirmou que mataram 80 soldados e que foi uma grande "tapa na cara". No final, os dois lados podiam declarar vitória e ninguém precisava acelerar a crise.

5. Iraque pode expulsar as tropas dos EUA

O Iraque é um país majoritariamente xiita, igual ao Irã (algo que aparentemente Bush não entendia quando lançou a guerra que derrotou o governo sunita do Saddam Hussein), e seus governos têm laços fortes desde a invasão de 2003. Enfurecido com o assassinato ilegal de Suleimani em seu território, o congresso iraquiano votou para expulsar as tropas americanas. A resolução foi não vinculativa, o que significa que o primeiro ministro não é obrigado de cumprir.

Se isso acontecer, seria uma grande humilhação para Trump. Mesmo que fale publicamente que quer tirar as tropas do Oriente Médio, ele quer fazer nos seus próprios termos.

Eu teria que escrever vários livros para explicar tudo sobre essa situação super complexa, mas espero que essa newsletter tenha ajudado a esclarecer alguns pontos importantes. O risco de guerra é menor do que era uns dias atrás, mas ainda é muito maior do que seria caso Trump não fosse o presidente. Mas podemos ter uma luz no fim do túnel: a eleição presidencial nos EUA é em novembro.

Quer saber mais sobre a política doméstica e estrangeira dos EUA? Me manda um e-mail com seu pedido e talvez eu faça uma newsletter ou vídeo sobre o assunto no futuro.


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