"Ocupação da noite" - Casimiro de Brito
As árvores apodrecem
de solidão, a nossa lado.
As mulheres envelhecem
na penumbra dos quartos.
Na fogueira das minas,
no degelo dos andaimes
os operários de pacíficos
trocam músculos por usura.
Nas cidades, no patamar
dos palácios, nos ministérios,
acrescentamos silêncio
ao silêncio do pântano.
Previmos a guerra, votamos
a guerra, favorecem-nos
os índices demográficos.
Ocupamos a noite e o dia
à sombra das armas —
o tempo que moldamos
a desígnios marciais.
Perdemos a infância, o amor
mas somos familiares
das minúcias do átomo. Pobres,
mais pobres do que o ar,
resta-nos a morte, o mistério
que vamos alimentando.
Casimiro de Brito
* Poema dos tempos negros que em Portugal vivemos sob o fascismo.
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