quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

"O Papalagui" - Erich Scheurmann


Este livro sistematiza uma coleção de discursos de Tuiavii, um chefe aborígene samoano de Tiávea da ilha de Upolu, A ilha de Samoa é um Estado soberano da Polinésia na Oceania. Este chefe descreve a sua visão sobre o europeu em um período anterior à Primeira Guerra Mundial. O alemão Erich Scheurmann (1878-1957) conseguiu reunir estes discursos após o apoio do chefe e traduziu para o alemão em 1920. O Papalagui é um termo samoano que traduzido literalmente significa o homem branco, ou, o europeu.
O autor vivera em Samoa durante a primeira guerra mundial e, segundo conta na introdução do livro, havia conquistado a confiança de Tuiávii – um chefe nativo local. Este lhe confiara os apontamentos que havia feito durante uma visita aos países da Europa, no fim do século anterior, e concordou com sua divulgação. Nas suas observações, ora divertidas, ora severas – mas invariavelmente justas – fica claro o choque de duas culturas tão diversas. O olhar de Tuiavii é, ao mesmo tempo inocente e crítico. Vai fundo ao mostrar os conflitos que surgem quando o respeito à natureza e a simplicidade, que fazem parte da essência dos nativos, se defrontam com a ânsia pelo progresso e a maneira complicada de ver e de viver do homem branco.
O Papalagui nunca está satisfeito com o tempo que tem... Nunca existe mais tempo do que aquele que vai do nascer ao por do sol e, no entanto, isto nunca é suficiente para o Papalagui”.

É nítida a crença de Tuiávii de que o tempo é cíclico. É algo que se renova a cada dia, o que ele entende como uma dádiva. Não é algo a priori escasso, como vê o Papalagui. Tuiávii não perde tempo pensando no tempo perdido ou no tempo a perder. Sabe que isso toma tempo e, principalmente, gera desgaste de energia e imobiliza.
“Certos Papalaguis dizem que nunca têm tempo: correm feito loucos de um lado para o outro com se estivessem possuídos pelo aitu (espírito malévolo)”.
O que diria Tuiávii se nos visse, hoje, 90 anos depois, aceleradíssimos, apertando botões e mais botões e parecendo que falamos sozinhos? E o que é pior: andando em círculos, pensando que estamos andando para a frente. Por vezes, tanto esforço para nada. Ou quase.
Acho que está na hora de reaprendermos a ver nosso tempo com olhos de um Tuiávii. Se o Papalagui não tem tempo é porque insiste em fatiá-lo e fragmentá-lo, sem perceber o seu todo.

Este é um livro antropológico, por excelência. Estamos habituados a uma antropologia feita por Ocidentais e aplicada aos chamados povos “exóticos” (?!), ou seja, é sempre o nosso olhar que constrói “o outro”. Mas é muito raro, para não dizer quase impossível, ler um texto antropológico que está na contramão da Antropologia tal como tem sido praticada no Ocidente, ou seja, o olhar do suposto “selvagem”, do suposto “primitivo” sobre nós, os supostos “civilizados”. Será que somos tão civilizados assim?
Para ler este livro fascinante, um sucesso mundial há várias décadas, clique aqui

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