segunda-feira, 30 de novembro de 2015

ELIANE BRUM: A lama


Como não pensar, a cada dia, que a lama avança. Essa lama tóxica que mata gente, mata bicho, mata planta, mata histórias. Essa lama que engoliu um povoado chamado Bento Rodrigues, assassina o Rio Doce, avança pelo oceano, atravessa os estados e segue avançando. Essa lama que deixou meio milhão sem água. Essa lama venenosa que vai comendo o mundo como se fosse um organismo vivo. Essa lama morta que se move. E ao se mover, mata. Enquanto alguém toma um café, pega o ônibus, reclama do trânsito, faz um selfie, se apaixona, assiste a uma série do Netflix, se preocupa com as contas, faz sexo, se queixa do chefe, sente que o cotidiano não está à altura de suas grandes esperanças, briga no Facebook, faz planos para as festas de fim de ano, engole umas gotas de Rivotril, a lama avança. Enquanto escrevo, a lama avança. Piscamos, e a lama avança. Parece quase impossível pensar em algo além de que a lama avança. E ninguém pode afirmar até aonde a lama vai chegar. 
Para ler o texto completo de Eliane Brum clique aqui

Les Statues Meurent Aussi: contribuição teórica para uma leitura pós-colonial

«Quand les hommes sont morts, ils entrent dans l’histoire. Quand les statues sont mortes, elles entrent dans l’art. Cette botanique de la mort, c’est que nous appelons la Culture », afirma Chris Marker em voz-off no plano inicial.

Les Statues Meurent Aussi (As Estátuas Também Morrem) nasce de uma encomenda remetida pela revista Présence Africaine, responsável por ter projetado escritores fundamentais no que respeita à teorização da identidade negra, como Aimé Césaire ou Léopold Senghor, a dois cineastas franceses, Alain Resnais e Chris Marker, que pretendia reflectir sobre o estatuto da chamada arte negra. O documentário, exemplo pioneiro da escola do cinéma verité, começou a ser pensado ainda no ano de 1950 e deveria, numa primeira instância, invocar o assunto principal, intitulando-se precisamente L’art Négre
Para ler o texto completo de Joaquim Pedro Marques Pinto clique aqui

"A distinção entre imigrante e refugiado vale em tempo de paz. Mas estamos em tempo de guerra"


"Temos a nossa quota-parte de responsabilidade na crise que agora nos sufoca", diz Roberto Beneduce, fundador do Centro Franz Fanon, de apoio psicológico aos imigrantes e refugiados, em Itália. 
Para ler o texto completo de Ana Dias Cordeiro clique aqui

Direito ao aborto e respeito à vida das mulheres

fora cunha flavia biroli

Nas últimas semanas, milhares de mulheres saíram às ruas de todo o Brasil para protestar contra o PL 5.069/2013, de autoria de Eduardo Cunha, que cria obstáculos para o atendimento no SUS de mulheres que foram violentadas. Caso se torne lei, o projeto, já aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, reduzirá o acesso ao aborto legal. 
Para ler o texto completo de Flavia Biroli clique aqui

MOÇAMBIQUE- Wiriamu, a vida antes e durante o massacre


Além da “anatomia de um massacre”, o historiador de origem moçambicana, Mustafah Dhada, quis mostrar no seu novo livro como viviam as pessoas de Wiriamu. Diz que é "uma oportunidade" para “o povo português” saber o que aconteceu e para o Estado português reconhecer publicamente o que se passou. 
Para ler o texto completo de Catarina Gomes clique aqui

PORTAL DA BIODIVERSIDADE - Manual do Usuário


O Portal da Biodiversidade é uma iniciativa do Ministério do Meio Ambiente e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Ele foi desenvolvido pela Universidade de São Paulo por meio de um projeto envolvendo a participação da GIZ, ICMBIO, FDTE, BIOCOMP, EACH e UNESP. A implantação e o desenvolvimento de funcionalidades complementares foram realizadas pela equipe do ICMBio. O Portal tem como objetivo disponibilizar para a sociedade dados e informações sobre biodiversidade gerados ou recebidos pelo Ministério do Meio Ambiente e as instituições a ele vinculadas. Atualmente, estão disponíveis as bases de dados de alguns dos sistemas mantidos apenas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Os dados coletados e publicados neste Portal formam a mais completa visão sobre a distribuição da biodiversidade brasileira já disponibilizada em um único repositório na internet. No Portal, é possível pesquisar, visualizar, fazer download e analisar os registros de ocorrência atualmente disponíveis. Este manual destina-se a todos aqueles interessados em acessar o Portal e conhecer um pouco mais sobre a biodiversidade brasileira. Nele estão descritas as principais funcionalidades do Portal e como utilizá-las. Como o Portal está em constante aprimoramento, este manual sofrerá atualizações sempre que necessárias, no senti do de disponibilizarmos as informações mais recentes sobre suas funcionalidades.
Para ter acesso ao Manual do Usuário clique aqui

Site gratuito traduz relato de africano que viveu como escravo no Brasil

O escravo Baquaqua

Site gratuito traduz relato de africano que viveu como escravo no Brasil

SYLVIA COLOMBO

DE SÃO PAULO


30/11/2015 

Mahommah Gardo Baquaqua era praticamente um adolescente quando desembarcou na costa do Nordeste brasileiro, em 1845, vindo da África num navio negreiro. Levado a Olinda, passou os próximos dois anos de sua vida tentando escapar da condição de escravo. Apanhou, tentou matar o mestre e falhou no intento de suicidar-se por afogamento no rio Capibaribe.
Por fim, trabalhando para um senhor que exportava café para os EUA, embarcou num navio para Nova York, em 1847. De lá, escapou e passou a colaborar com abolicionistas. Também viajou ao Canadá, Haiti e Reino Unido.
A cinematográfica trajetória de Baquaqua ganha vida no site www.baquaqua.com.br, que entra no ar nesta segunda (30/11). Traz pela primeira vez a íntegra traduzida ao português da biografia que Baquaqua escreveu com a ajuda do irlandês Samuel Moore, e que foi publicada em 1854, em Detroit.
O site, projeto de uma equipe, é coordenado pelo brasileiro Bruno Véras, doutorando na Universidade de York, no Canadá, e orientado pelo especialista em escravidão norte-americano Paul Lovejoy.
Além da íntegra do texto, que sai também em livro em 2016, estão no ar vídeos, entrevistas, imagens e relatos.
"O projeto estará em português, francês, inglês, francês e hausa, que são os idiomas dos lugares por onde passou. Ser escravo não significava não ter uma individualidade. O Baquaqua tinha uma identidade, falava vários idiomas, viajou, lutou contra a sua condição, se relacionou e manteve afetos", diz Véras à Folha.
FAMÍLIA MUÇULMANA
A narrativa de Baquaqua é irregular, e mostra as dificuldades que Moore teve em compreender e traduzir o relato, e também transita entre a terceira e a primeira pessoa, o que torna difícil ver até que ponto o irlandês interveio.
Ainda assim, pode-se entender como era a sociedade em que ele nasceu (entre 1820 e 1830) no atual Benin, de uma família muçulmana influente, e ter uma ideia das condições em que os negros eram transportados às Américas.
Há descrições do Brasil e da vida de escravo nesse período em que já era ilegal trazer negros para trabalhos forçados aqui. "Desde 1831 já era proibido escravizar negros trazidos da África, mas Baquaqua esteve entre os que vieram enquanto essa proibição era chamada de 'lei para inglês ver'. Ou seja, o Brasil havia cedido a pressões da Inglaterra para interromper o tráfico, mas não cumpria", explica Véras.
Seus últimos anos da vida são pouco conhecidos. Sabe-se que embarcou para a Inglaterra, na esperança de poder rumar de volta para a África. Tampouco se conhece a data de sua morte. Não há registros sobre Baquaqua além de 1857.
Leia, abaixo, os principais trechos da entrevista com o historiador norte-americano Paul Lovejoy, autor de "Escravidão na África" (Civilização Brasileira) e orientador do projeto Baquaqua.
*
Folha - Por que publicar esse trabalho on-line e não apenas tratá-lo de forma acadêmica?
Paul Lovejoy - Com as histórias de Baquaqua acessíveis, as pessoas podem entender o que aconteceu com esse indivíduo. Baquaqua foi da África Ocidental para o Brasil e para os EUA, daí ao Haiti e depois de novo para os EUA, para o Canadá e para o Reino Unido. Nós acreditamos que ele voltou para a África no final da vida. Ou seja, ele viajou por todo o mundo atlântico. Com sua história on-line em várias línguas, estudantes podem acessá-la e professores podem usá-la para combater o racismo. O projeto faz ver que Baquaqua era uma pessoa, um indivíduo. A escravidão foi parte de sua história. Ele foi escravizado duas vezes. Depois disso, passou muito tempo combatendo a escravidão Baquaqua era uma pessoa real. Tinha mãe, pai, irmãos, tios e tias.

Que particularidades desse texto nos trazem novos aspectos da escravidão no Brasil?
Nós sabemos que a escravidão foi terrível. Baquaqua foi maltratado em Pernambuco, quando chegou ao Brasil. Tentou fugir, tentou suicidar-se, pensou em matar seu mestre. Apanhou muito. A história de Baquaqua reforça que a escravidão foi terrível, mas mostra que pessoas como ele tentaram resistir e lutar contra ela. Torná-la acessível online faz com que possamos divulgar a história dessas pessoas reais e fazer com que se deixe de considerá-las apenas algo a que chamamos de "escravos". Foram pessoas com coração, dores, amores, devoção a suas famílias, caráter, força e comunidade.

Qual é a importância do projeto?
Queremos entender a história africana em seu contexto e não apenas como uma migração de pessoas escravizadas que afetou as Américas. Baquaqua veio de um importante centro comercial, e queremos chamar a atenção para a complexidade dessa região, assim como para a sofisticação da sociedade muçulmana africana. A família de Baquaqua era muito importante no comércio e era muçulmana. Sua mãe era hausa por cultura e nascimento, nascida em Katsina, uma das mais antigas cidades muçulmanas da África, que hoje está na Nigéria. Seu tio trabalhava com prata, ouro e ferro. A família de seu pai viera do Marrocos. Baquaqua foi à escola, aprendeu árabe. Outro de seus tios era professor, e o irmão, um conselheiro do rei. Nossa tarefa é fazer com que o contexto africano da escravidão fique claro.

*
TRECHOS DO RELATO
"Quando todos nós estávamos prontos para embarcar, fomos acorrentados uns aos outros, amarraram cordas em volta de nossos pescoços. (...) Uma espécie de festa foi feita em terra firme aquele dia. Aqueles que remaram os barcos foram fartamente regalados com uísque, e aos escravos deram arroz e outras coisas gostosas em abundância. Não tinha consciência de que aquele seria meu último banquete na África. Não sabia do meu destino. Feliz de mim que não sabia."
"Disse a ele [ao senhor] que nunca mais me chicoteasse e fiquei com tanta raiva que me veio à cabeça a ideia de matá-lo e me suicidar depois. Por fim, resolvi me afogar. Preferia morrer a viver como escravo. Corri para o rio e me joguei na água, mas como umas pessoas que estavam num barco me viram, fui resgatado. A maré estava baixa, senão seus esforços teriam sido infrutíferos."
"Talvez fosse importante notar aqui que, na África, as nações, das distintas partes da região, adotam diferentes maneiras de raspar a cabeça e, através dessa marca, pode-se saber sua região de origem. Em Zoogoo [onde Baquaqua nasceu], o cabelo é raspado em ambos os lados da cabeça. No alto da cabeça, desde a testa até atrás, deixa-se o cabelo crescer em três mechas redondas, bem compridas, e os espaços entre elas são raspados bem rentes. Para alguém familiarizado com os diferentes cortes de cabelo, não há qualquer dificuldade em saber a que lugar um homem pertence." 

FONTE: Aqui

sábado, 28 de novembro de 2015

Inação diante da morte de mulheres negras é perpetuar o genocídio da população negra

Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Quero falar de uma morte psicológica que é banalizada. Um assassinato silenciado. Uma morte silenciosa. 

Para ler o texto completo de Monique França Freixo clique aqui

Tudo é lindo na política externa norte-americana

Pete Souza

A grande mídia corporativa dos EUA apoia a política externa do governo apresentando um mundo distorcido ao público norte-americano. 

Para ler o texto completo de Dave Lindorfff clique aqui

Para desvendar o elitismo do Judiciário brasileiro

ilustracao

Tese de doutorado começa mapear a teia de relações aristocráticas e capitalistas que torna Justiça tão favorável ao poder e hostil aos pobres. 
Para ler o texto completo de Cida de Oliveira clique aqui

Žižek: A economia política dos refugiados

Zizek Paris

O presente artigo pode ser lido como uma continuação do último artigo de intervenção de Slavoj Žižek, Perturbação numa redoma, que reformula o impasse do capitalismo global de hoje à luz do rescaldo dos ataques terroristas do dia 13 de novembro de 2015 em Paris. No entanto, o texto pertence também a um debate maior acerca da dita “crise dos refugiados” na Europa. Nele, Žižek responde diretamente a algumas das críticas que foram feitas à seus posicionamentos polêmicos e apresenta de forma mais extensa alguns dos desdobramentos de sua reflexão sobre o tema. Nas suas palavras: “Tomar o controle da crise de refugiados significará quebrar tabus da esquerda.” 
Para ler o texto completo de Slavoj Žižek clique aqui

Pós-modernismo e o feminismo reacionário

Theoretische Hintergründe der neuen Kämpfe. «Luxemburg Lecture» mit Ellen Meiksins Wood, 8.5.2012, Berlin
http://www.rosalux.de/event/45899

O texto a seguir é uma contribuição ao debate que pretendo fazer aqui sobre a destruição do feminismo revolucionário pelo pós-modernismo e sua influência teórica em outras linhas de pensamento pretensamente revolucionárias, como o altermundialismo. Nele, a socióloga Maria Lygia Quartim de Moraes (doutora em Ciência Política e pesquisadora do Pagu – Núcleo de Estudo de Gênero da UNICAMP e do Grupo “Família, Gênero e Sociedade”do CNPq) analisa o pensamento de Ellen Meiksins Wood (foto), professora de Ciência Política na Universidade York e autora de A origem do capitalismo (2001), Em defesa da história (organizadora, 1999), The Pristine Culture of Capitalism (1992) e The Retreat from Class (1986).
Para ler o texto completo de Maria Lygia Quartim de Moraes clique aqui

Relação Angola Cuba, entrevista a Christabelle Peters

O presidente Agostinho Neto em visita a Cuba, em 1976, acompanhado dos irmãos Castro | JA Imagens
O presidente Agostinho Neto em visita a Cuba, em 1976, acompanhado dos irmãos Castro |

A ligação, nas suas várias dimensões, entre Angola e Cuba (ou, em primeira instância, entre o MPLA e o regime de Fidel Castro) é importante – e também misteriosa. Muita informação está por desvendar e estudar. As duas partes reforçaram os contatos e as relações diplomáticas no pós-independência e durante o período de guerra.
Os milhares de militares cubanos que ajudaram o MPLA a combater a UNITA e o regime do apartheid foram uma força essencial no desfecho do conflito. Mesmo que só tenha terminado 13 anos depois da saída dos militares cubanos do país – que aconteceu em 1989.
Para ler a entrevista de Christabelle Peters clique aqui

O mito interesseiro da “autorregulação”

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Aos poucos, Estados transferem poder de regulamentar vida econômica e financeira aos “mercados”. Se não for freada, tendência destruirá direitos sociais e natureza.
Para ler o texto completo de George Monbiot clique aqui

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Silvio Rodríguez: "Haverá outra revolução, no futuro"

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Em meio a turnê pelos bairros populares de Cuba, compositor debate nova relação com EUA, conquistas culturais do país e riscos de acomodação. Ele avisa: “não subestimem a centelha do povo”. 
Para ler o texto completo de Fernando Ravsberg clique aqui

"Nenhuma outra" - Pablo Neruda


Nenhuma outra

Já és minha. Repousa com teu sono no meu sono.
Amor, dor, trabalhos, devem dormir agora.
Gira a noite em suas rodas invisíveis
e ao meu lado és pura como o âmbar adormecido.

Nenhuma outra, amor, dormirá com meus sonhos.
Irás, iremos juntos pelas águas do tempo.
Nenhuma outra viajará pela sombra comigo,
apenas tu, sempre-viva, sempre sol, sempre lua.

Já tuas mãos abriram os punhos delicados
e deixaram cair suaves signos sem rumo,
teus olhos fecharam-se como duas asas cinzentas,

enquanto eu sigo a água que levas e me leva:
a noite, o mundo, o vento fiam o seu destino,
e sem ti já não sou senão apenas o teu sonho.


Pablo Neruda

CINEAD: Currículo de Cinema para Escolas de Educação Básica


O desafio deste material é oferecer uma proposta curricular de escolas de cinema para escolas de Educação Básica que possa ser recriada por cada grupo de professores e estudantes a cada nova iniciativa. 
Para ler os 10 textos desta coletânea clique aqui

Diante da dor dos outros

Diante da foto feita por Carter, no Sudão, em 1993, surgem questões éticas.

A contundência da fotografia do fotógrafo sul-africano Kevin Carter, em que a criança faminta é observada por um abutre em um cenário desolado no Sudão, remete diretamente à história da fotografia que, a partir de 1890, reivindica o status de obra de arte. 
Pra ler o texto completo de Arlenice Almeida da Silva clique aqui

O Estado Islâmico, cancro do capitalismo moderno, por Nafeez Ahmed - III

nafeez ahmed - I

No Iraque e na Síria, onde o Estado islâmico nasceu, o estado de devastação no qual a sociedade se encontra, na sequência de uma situação de conflito prolongado, não pode ser subestimada. A invasão militar e a ocupação do Iraque pelo Ocidente, com o seu lote de tortura e de violência cega, jogaram um papel inegável para abrir a via à emergência de uma política reacionária extrema. Antes da intervenção ocidental, al-Qaeda estava totalmente ausente do país. Na Síria, a guerra brutal efetuada por Assad contra o seu próprio povo continua a ser a justificação para  a presença do Estado islâmico e para continuar a atrair combatentes estrangeiros. 
Para ler o texto completo de Nafeez Ahmed clique aqui

HUMOR: Brasil pode ganhar em breve 30 novos santos de uma só vez

Após processo aberto em 1989, três padres André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro, Mateus Moreira e 27 leigos foram beatificados
Após processo aberto em 1989, três padres André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro, Mateus Moreira e 27 leigos foram beatificados

José de Sousa Miguel Lopes

Como todos sabem, cada vez tem sido mais difícil para a Igreja Católica recrutar padres. Santos, então, nem se fala!  Se antigamente era mais fácil “descobrir” santos, pois os milagres proliferavam por tudo quanto é canto num mundo impregnado de obscurantismo e ignorância hoje, com o avanço da ciência, os milagres escasseiam para não dizer que sumiram da paisagem contemporânea. Ora, para a igreja isso é preocupante, pois a cada santo que surge, desencadeia-se a necessidade de fazer emergir novos santos. Mas como obtê-los no mercado da fé, se os milagres desapareceram? Sabemos que um novo santo faz emergir novos rituais a que de imediato se agregam fontes de obtenção de dinheiro para alimentar os cofres do Vaticano. Afinal de que vivem os clérigos, não é mesmo?

Mas e se não ocorrem milagres? Significa que, concomitantemente, também não surgirão santos. E aí a questão parece tornar-se insolúvel. Mas só na aparência. Pois se houver criatividade, coisa que nunca faltou aos clérigos, tudo se resolve. É o caso da notícia que hoje, dia 27/11/2015, nos surge em todo o seu esplendor. Ela pode ser lida aqui 
O Brasil vai apresentar um novo santo ao mundo do catolicismo? Isso já seria uma notícia fabulosa. Mas atenção, não é um santo não, mas três dezenas (30)!!! Nos idos de 1500, na carta ao Rei de Portugal, o cronista Pero Vaz de Caminha dizia que o Brasil era uma terra tão fértil que em nela plantando tudo dá!!! E não é que ele tinha razão? Não só dá, mas dá em quantidades industriais, de fazer inveja a qualquer moderna linha de montagem de produção de artefatos tecnológicos. E, por outro lado, esta notícia é extremamente benéfica para o Brasil, atolado que está nos últimos tempos no mar de lama da corrupção. Até políticos e banqueiros são enclausurados, ao que nós chegamos, já não há respeito! Mas é um conforto para a grande massa, que era enclausurada por ter furtado uma galinha ou um sabonete num supermercado, saber que um senador e um dono de um banco podem também ficar atrás das grades. Para que não se construa a ideia de que este país é um território onde só grassa a torpeza e a malvadez, temos que reconhecer como promissora esta notícia. Ela revela o lado do Brasil que tem andado em baixa nos últimos anos: o quanto é profundamente sagrado este solo, pois ele é capaz de produzir num único episódio histórico, não um santo, mas 30!

Mas onde estão os 30 milagres para atestar as 30 pessoas que agora precisam ser santificadas? Bom, milagres não aconteceram, mas é preciso encontrar um novo método, mais adequado aos tempos modernos e não preso a esse mundo carregado de ignorância, que a ciência vai deixando para trás. Agora basta ter coragem em aceitar morrer por uma crença para ser considerado santo. Vejam que o acontecido não ocorreu agora, mas lá atrás, no mundo onde a ignorância reinava soberana. Portanto não mudou o cenário histórico onde ocorreu o fenômeno, mas sim o método para avalia-lo. Já não mais se exige o milagre para canonizar alguém. Basta resgatar a coragem. Apressadamente, o papa, diz-nos a notícia, “manifestou interesse na canonização, que poderá ser feita por decreto, sem exigência de milagres, porque os mártires foram mortos por confessarem a fé católica". Finalmente o Vaticano descobriu a galinha dos ovos de ouro para resolver seu fluxo de caixa. Dá para imaginar agora o Vaticano instruindo os seus clérigos para se lançarem em aturadas pesquisas por forma a descobrirem mais santos. Não é difícil, pois o que nunca faltou neste mundo foram guerras religiosas. O mais difícil (ou o mais fácil?) é encontrar os nomes desses novos santos, mas nada que não seja um problema intransponível. Quem sabe através do método Carbono 14, associado a uma pequena porção de água benta, não se consiga detectar o nome dessas pessoas? Mão à obra, pois o tempo urge e os cofres do Vaticano precisam retomar o seu tradicional crescimento! “Ai que cansaço”, dirão os clérigos que forem destacados para realizar estas pesquisas. E finalizarão “Ai que saudades que tenho dos bons velhos tempos dos milagres!!!”

Licínio de Azevedo e o cinema de Moçambique em retrospectiva


Licínio de Azevedo e o cinema de Moçambique em retrospectiva

Cinemateca Portuguesa apresenta durante Dezembro obra do cineasta e escritor brasileiro radicado naquele país africano.
É caso raro podermos assistir à retrospectiva integral de um cineasta africano ainda em actividade. Razão mais do que suficiente para referir o ciclo dedicado pela Cinemateca Portuguesa, a partir do próximo dia 1, a Licínio de Azevedo (n. 1951), realizador de Virgem Margarida, sob o genérico O Espírito do Lugar – Licínio de Azevedo, Cineasta de Moçambique. Ao longo de todo o mês de Dezembro, serão apresentadas as mais de duas dezenas de obras, entre curtas e longas-metragens, ora documentários ora ficções, que o cineasta dirigiu ou co-escreveu a partir de 1986, filmes que se inscrevem numa ideia do cinema como indissociável do lugar e da cultura onde é pensado e realizado. 
Nascido no Brasil mas radicado em Moçambique desde 1977, altura em que ingressou no Instituto Nacional de Cinema daquele país a convite de Ruy Guerra, Azevedo começou por dedicar-se ao jornalismo no seu país natal, prestando especial atenção aos temas da América Latina. Após a sua instalação em Moçambique, onde contactou de perto com Jean Rouch e Jean-Luc Godard, a sua carreira tem-se desenrolado essencialmente entre a literatura e o cinema, mesmo que a singularidade da sua obra cinematográfica tenha limitado a sua divulgação entre nós; o ciclo da Cinemateca, apresentado nos formatos originais (formatos vídeo ou cópias digitais) será assim em grande parte uma revelação para o espectador interessado, num momento em que o trabalho cinematográfico realizado nos países africanos de língua portuguesa está a atrair a atenção de muitos estudiosos de cinema. 
Do ciclo constam as suas cinco longas-metragens – A Guerra da Água (documentário, 1996), Mariana e a Lua (documentário, 1999), Desobediência (ficção, 2002), A Ilha dos Espíritos (documentário, 2009) eVirgem Margarida (ficção, 2012) – bem como o documentário que lhe foi dedicado por Margarida Cardoso, Crónicas de Moçambique (2011). Os filmes surgirão enquadrados pelas múltiplas curtas e médias que foi rodando, entre os quais a série de documentários de curta-metragem Histórias Comunitárias e dois títulos rodados para a BBC, Adeus RDA (1992) e A Árvore dos Antepassados (1996). 
Licínio de Azevedo estará presente em Lisboa ao longo do ciclo para acompanhar algumas das projecções, a começar pela abertura oficial, esta terça-feira (dia 1 de Dezembro) às 21h30, com a exibição de Virgem Margarida, a única das suas obras a ter tido (breve) exibição comercial entre nós. O cineasta ultima neste momento uma nova longa de ficção, O Comboio de Sal e Açúcar, que foi um dos vencedores do laboratório de produção do festival de Locarno Open Doors em 2014. O programa completo da retrospectiva pode ser consultado em www.cinemateca.pt
FONTE: Aqui
Vela o trailer de seu filme "Virgem Margarida", clicando no vídeo abaixo
  http://s.publico.pt/NOTICIA/1715558 http://s.publico.pt/brasil/1715558 http://s.publico.pt/mocambique/1715558 http://s.publico.pt/lisboa/1715558 http://s.publico.pt/culturaipsilon/1715558 http://s.publico.pt/cinema/1715558 http://s.publico.pt/america-latina/1715558 http://s.publico.pt/cinemateca/1715558 http://s.publico.pt/cinemateca-portuguesa/1715558 

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

China: Enterrados vivos


Houve uma explosão, o boom econômico chinês. Wang Bing tem sido o grande documentarista dos estilhaços: pessoas e memórias apagadas pela economia. Deste incansável aventureiro pelos desertos do esquecimento estreiam-se dois filmes monumentais.
Para ler o texto completo de Vasco Câmara clique aqui

Como descobrir se uma usina nuclear poderá ser uma Chernobyl ou uma Fukushima


Nas usinas de Chernobyl e de Fukushima e, anteriormente, em Three Mile Island (TMI), ocorreu o acidente de fusão do combustível nuclear, o urânio. Este acidente é conhecido como acidente severo e não fazia parte do projeto de segurança destas usinas ou das usinas de projeto da década de 1970.
Para ler o texto completo de Sidney Luiz Rabello clique aqui

"A Identidade Cubana e a Experiência Angolana"

Angola, fotografia de Ernesto Fernandez

Cinco de Novembro de 1975 marcou o 132º aniversário da rebelião dos escravos da plantação de açúcar Triumvirato, na província de Matanzas, liderada por uma mulher africana escravizada chamada Carlota. Num dos primeiros actos da sua campanha de libertação, Carlota, acompanhada pelos seus capitães, dirigiu-se a outra plantação, Arcana, na qual um conjunto de co-conspiradores se encontravam detidos no seguimento de uma revolta ali ocorrida em Agosto do incendiário Verão daquele ano, quando os africanos e seus descendentes se ergueram contra os seus escravizadores por toda a província. À medida a que se espalhou a notícia dos sucessos de Carlota, um estado após outro irrompeu em insurreição – San Miguel, Concepción, San Lorenzo e San Rafael. 
Para ler o texto completo de Christabelle Peters clique aqui

Chatô, réu do Brasil

timthumb

Finalmente lançado, filme de Guilherme Estrela foge da reconstituição histórica e flerta com a chanchada. Mas, ao fazê-lo, cumpre papel importante: retratar, de modo debochado, o macho oligarca brasileiro.
Para ler o texto completo de José Geral Couto clique aqui

Igualdade de gênero. Porquê ela é boa para todos - incluindo os homens

genero

Sim, todos sabemos que é a coisa certa a fazer. Mas Michael Kimmel torna engraçado, surpreendente e prático o caso de tratar igualmente homens e mulheres no local de trabalho e em casa. Não é um jogo que resulta em empate zero a zero, mas na vitória mútua que irá resultar em mais oportunidades e mais felicidade para todos.
Para ler o texto completo de Michael Kimmel clique aqui

Oslo tem planos… contra os automóveis

151124-Oslo3

Estudo na capital da Noruega sugere eliminar circulação de carros no centro, compensando-a com transporte coletivo e ciclovias. Helsinki e Hamburgo lançam projetos semelhantes.
Para ler o texto completo clique aqui

Derrubada de avião russo: o mundo próximo à guerra

151124-Chomsky3

Noam Chomsky explica: Turquia, que é aliada dos EUA e disparou míssil, tornou-se ameaça à democracia e à paz internacional. Washington já é incapaz de gerir seu império.
Para ler o texto completo de Antonio Martins clique aqui

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Nem justiça, nem reconciliação: reflexões sobre a Comissão Nacional da Verdade no Brasil


CNV foi capaz de atender, parcialmente, às demandas por verdade das vítimas sem atingir, frontalmente, interesses dos herdeiros da ditadura. 

Para ler o texto completo de Rinan Quinalha clique aqui

Se Deus vier que venha armado

Palito-na-dança

Da ideia do roteiro ao lançamento, Se Deus Vier que Venha Armado” percorreu uma trajetória de oito anos e três editais. Primeiro longa-metragem do diretor paulistano Luis Dantas, ele chega agora às telas dos cinemas brasileiros. 
Para ler o texto completo clique aqui
Leia também Se Deus vier que venha armado”: entre a arte e a realidade” clicando aqui

Homossexualidade e DNA


Homossexualidade e DNA

Drauzio Varella

14/11/2015

"Quem quiser gostar de mim, eu sou assim", diz o samba de Wilson Baptista.
A homossexualidade tem forte componente genético. Diversos estudos com gêmeos univitelinos demonstraram que, quando um deles é homossexual, a probabilidade de o outro também o ser varia de 20% a 50%, ainda que separados quando bebês e criados por famílias estranhas.
Nas duas últimas décadas, acumulamos evidências científicas suficientes para afirmar que a homossexualidade está longe de ser mera questão de escolha pessoal ou estilo de vida. É condição enraizada na biologia humana.
Nunca houve nem existirá sociedade em que a homossexualidade esteja ausente. O estudo mais completo até hoje, realizado por Bailey e colaboradores da Austrália, mostrou que 8% das mulheres e dos homens são homossexuais.
Em 1993, o geneticista Dean Hamer propôs um caminho para a identificação dos "genes gay", sequências de DNA que estariam localizadas no cromossomo X (região Xq28). A descrição virou manchete de jornal, mas não pôde ser confirmada por outros pesquisadores, requisito fundamental para adquirir validade científica.
O fato de que 20% a 50% dos gêmeos univitelinos apresentam concordância da homossexualidade ressalta a influência genética, mas deixa evidente que a simples identidade de genes não justifica todos os casos.
Em 2012, William Rice propôs que a epigenética explicaria com mais clareza a orientação sexual. Damos o nome de epigenéticas às alterações químicas do DNA que modificam a atividade dos genes sem no entanto alterar-lhes a estrutura química.
Durante o desenvolvimento, os cromossomos podem sofrer reações químicas que não afetam propriamente os genes, mas podem "ativá-los" ou "desligá-los". O exemplo mais conhecido é a metilação, processo em que um radical metila (CH3) se fixa a uma região específica do DNA, formando o que chamamos de epimarca.
Como algumas epimarcas são silenciadas nos óvulos e espermatozoides, enquanto outras podem ser transmitidas aos descendentes, Rice propôs que epimarcas ancoradas junto aos genes responsáveis pela sensibilidade à testosterona podem conduzir à homossexualidade quando transmitidas do pai para a filha ou da mãe para o filho.
Especificamente, ainda no ventre materno, epimarcas que afetam a resposta às ações da testosterona produzida pelos testículos ou ovários fetais são capazes de masculinizar o cérebro de meninas ou afeminar o dos meninos, conduzindo mais tarde à atração homossexual.
O grupo de Eric Vilain, um dos mais conceituados nessa área, estudou 37 pares de gêmeos idênticos discordantes (apenas um homossexual) e dez pares concordantes.
A avaliação de 140 mil regiões do DNA desses gêmeos permitiu identificar cinco delas em que os padrões de metilação guardavam relação direta com a orientação sexual em 70% dos casos.
Por que razão alguns gêmeos idênticos terminam com padrões distintos de metilação?
Segundo Rice, epimarcas podem ser apagadas num irmão e persistir no outro. Vilain concorda: diferenças sutis no ambiente intrauterino, ditadas pela circulação do sangue e pela posição espacial de cada feto, seriam as causas mais prováveis.
A antiga visão do sexo como um binário condicionado pelos cromossomos XX ou XY está definitivamente ultrapassada. Ela é incapaz de explicar a diversidade de orientações sexuais existente nos seres humanos, nos demais mamíferos e até nas aves.
Transmitidas de pais para filhos, epimarcas específicas nas regiões do DNA ligadas às reações dos tecidos fetais à testosterona oferecem bases mais sólidas, inclusive para entender os casos de bebês com órgãos sexuais ambíguos e das pessoas que julgam haver nascido em corpos que não condizem com sua individualidade sexual.
A homossexualidade é um fenômeno de natureza tão biológico quanto a heterossexualidade. Esperar que uma pessoa homossexual não sinta atração por outra do mesmo sexo é pretensão tão descabida quanto convencer heterossexuais a não desejar o sexo oposto.
Os que assumem o papel de guardiões da família e da palavra de Deus para negar às mulheres e aos homens homossexuais os direitos mais elementares não são apenas sádicos, preconceituosos e ditatoriais. São ignorantes.

FONTE: Aqui 

David Harvey aposta na radicalização das cidades

ou contra a desurbanização. Acredito que seria igualmente desastroso, em termos ecológicos, espalhar todos pelos campos

Entrevistado no Brasil, ele sustenta: é nos grandes centros urbanos que capitalismo contemporâneo se reproduz — mas é de lá, também, que pode surgir alternativa.
Para ler a entrevista de David Harvey clique aqui

América Latina: fim de ciclo?

BRAZIL-MERCOSUR-SUMMIT

Triste vitória conservadora na Argentina expõe debilidades de projeto político que marcou a região. Mas não é o fim do mundo – e talvez obrigue esquerda a saudável reinvenção…
Para ler o texto completo de Alejandro Mantilla Q clique aqui

Estados Unidos: hora do despertar?

Estudantes da Universidade da Califórnia manifestam-se em solidariedade com os protesto na Unversidade do Missouri – Foto Eugene Garcia/Epa/Lusa

Em apenas uma semana, vários reitores e acadêmicos viram-se obrigados a renunciar aos seus postos, a convocar reuniões de urgência e a se comprometerem com medidas contra o racismo, para responder aos milhares de protestos realizados pelos universitários que denunciaram a discriminação e a falta de ação das autoridades acadêmicas. 
Para ler o texto completo de David Brooks clique aqui

Katie Melua - "Thank you, Stars"


Para ver a interpretação "Thank you, Stars" na voz de  Katie Melua clique no vídeo aqui

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Mia Couto: "O bem não é exclusividade da França, da Europa ou do Ocidente"

Mia-Couto

Não é exagero afirmar que o moçambicano Mia Couto é um dos escritores de língua portuguesa mais importantes da atualidade. Apontado como candidato ao Nobel de Literatura e finalista do Man Booker International Prize deste ano, o autor de livros consagrados como “Terra Sonâmbula”, “O Último Voo do Flamingo” e “Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra” agora dá início à primeira trilogia de sua carreira, intitulada “As Areias do Imperador”. Nela, Mia constrói um romance histórico sobre a época que o sul de seu país era governado por Ngungunyane, último líder do Estado de Gaza, segundo maior império do continente a ser comandado por um africano, combatido por Portugal por ameaçar o domínio da metrópole sobre sua colônia.
Para ler a entrevista de Mia Couto clique aqui

O terrível custo sobre o qual ninguém fala de ter um doutorado


O terrível custo sobre o qual ninguém fala de ter um doutorado

Jennifer Walker

Uma noite, no terceiro ano do meu doutorado, eu sentei na minha cama com um pacote de tranquilizantes e uma garrafa de vodka. Joguei algumas pílulas para dentro da boca e dei um golão na garrafa, sentindo tudo queimar na minha garganta. Momentos depois, eu percebi que estava cometendo um erro terrível. Eu parei, tremendo, enquanto eu me dava conta do que quase havia feito. Eu liguei para uma amiga e a encontrei num bar no meio do caminho entre as nossas casas. Aquela noite mudou as coisas para nós duas. Ela conheceu o amor da sua vidao bartender, com quem se casou mais tarde. E eu decidi que eu queria viver. Na manhã seguinte, encontrei um terapeuta e considerei largar o doutorado.
Todos sabem que ter um doutorado é difícil. É pra ser. Alguns até dizem que se você não fica acordado à noite toda trabalhando ou não pula refeições, você está fazendo errado. Mas enquanto os alunos do doutorado não são tão ingênuos a ponto de esperar que isso seja um passeio, há um custo para essa empreitada sobre o qual ninguém fala: o psicológico.
Os dias que eu passei perseguindo meu doutorado em física foram dos meus piores. Não eram os desafios intelectuais ou a carga de trabalho que me deixavam pra baixo: era minha saúde mental deteriorando. Eu me sentia desamparada, isolada e à deriva em um mar de incertezas. Ataques de ansiedade se tornaram parte do meu dia a dia. Eu bebia e me cortava. Às vezes, eu pensava que queria morrer.
Eu poderia não ter me sentido tão sozinha se eu tivesse sabido quantas pessoas sofrem com questões de saúde mental na academia. Um estudo de 2015 da Universidade Berkeley da Califórnia descobriu que 47 % dos alunos de pós-graduação sofrem de depressão, seguindo um estudo anterior, de 2005, que mostrava que 10% cogitava suicídio. Um estudo australiano de 2003 descobriu que as taxas de doenças mentais no grupo acadêmico eram de três a quatro vezes maiores do que na população em geral, de acordo com um artigo da New Scientist. O mesmo artigo nota que a porcentagem de acadêmicos com doenças mentais no Reino Unido é estimada em 53%.
Mas a atitude durona que permeia a torre de marfim pode induzir muitas pessoas que sofrem com a saúde mental a deixar seus problemas escondidos, enquanto outros simplesmente aceitam a depressão como parte do percurso. E na cultura quase darwiniana entre estudantes de pós que competem por um punhado de trabalhos como professor universitário, muitas pessoas assumem que problemas psicológicos são só para os fracos.
“Eu achavae torcia paraque apenas tomar uns antidepressivos e trabalhar mais pudesse ser o suficiente”, disse Jane*, uma doutoranda em biologia que foi diagnosticada com ansiedade e depressão. “E como as coisas não melhoraram rápido, isso ainda afetou o meu humor”.
Essencialmente, muitos alunos de doutorado estão tão acostumados a trabalhar duro e se autodisciplinar que eles se flagelam quando seus esforços para lidar com a depressão não produzem resultados perfeitos.
Um sentimento geral de isolamento pode, ainda, pesar mais em alunos de pós que passam muito do seu tempo enterrados sob uma pilha de livros, sozinhos, em laboratórios.
“As questões que afetam alunos em geral, que podem influenciar também nos alunos de doutorado, é viver e trabalhar independentemente”, diz Anoushka Bonwick, diretora de projetos e relacionamentos na Student Minds, entidade filantrópica britânica.
Igualmente estressante é o fato de os alunos do doutorado enfrentarem “incertezas sobre o futuro, como bolsa para a pesquisa e o que vão fazer depois do doutorado”.
Essas questões podem ser ainda mais impactantes em alunos que não possuem orientadores que os apoiam.
“Minha maior dificuldade era a sensação de ser largado à deriva”, diz Andrew*, ex aluno de doutorado em física que saiu do programa meses antes de terminar. “Eu não tinha um orientador envolvido ou que colocasse a mão na massa. ” Enquanto ele largou o programa em parte para trocar de lugar com seu colega, diz que “um orientador mais envolvido poderia ter mudado as coisas”.
Outros alunos de doutorado sofrem, com frequência, da síndrome do impostor. Isso foi parte do meu problema mesmo antes de sinais de uma doença mental séria terem começado a aparecer. Eu sentia que fui longe na carreira acadêmica por acaso e que as notas altas que eu tinha recebido na faculdade e no mestrado tinham sido um erro administrativo. Isso alimentou tanto minha ansiedade quanto minha depressão.
A síndrome do impostor é um problema frequente entre alunos com bom desempenho que se encontram rodeados de outros como eles, de acordo com Linda*, professora de sociologia de New Jersey. “É muito comum se sentir uma fraude incompetente, e geralmente você assume que é o único que se sente daquele jeito”, ela relata.
A frequência desses problemas não deveria assustar futuros alunos que querem conseguir um doutorado. Mas eles deveriam ser preparados a pensar sobre como eles vão lidar com os desafios psicológicos ao lado dos desafios intelectuais.
“Acho que primeiramente é muito importante procurar os serviços de apoio que a universidade oferece”, diz Bonwick. Isso pode significar qualquer coisa, desde aconselhamento da universidade até grupos de apoio de alunos.
Universidades e escolas estão também se esforçando para fazer mais para apoiar alunos de pós graduação. Organizações sem fins lucrativos para alunos como o Student Minds, no Reino Unido, e Active Minds e o programa de campus “Health Matters ” de Jed e Clinton, nos Estados Unidos, colaboram com instituições educacionais para alertar sobre assuntos de saúde mental entre os alunos, assim como para estabelecer uma rede de apoio.
Além dessas iniciativas, as universidades precisam fazer mais para treinar orientadores a reconhecer sinais de alerta de qualquer coisa, desde depressão em estágios iniciais e ansiedade a tendências suicidas e abuso de substâncias. E é necessário criar uma cultura de abertura que não apenas remova o estigma associado a problemas de saúde mental mas também que encoraje os alunos a procurar ajuda.
“A academia compreende, mas talvez aceite até demais, que todo mundo tenha problemas”, diz Jane. “Só porque muitas pessoas têm problemas de saúde mental, não quer dizer que seja ok ou ‘é assim que é’”.
Por fim, é importante que tanto os que querem ser quanto os que já são alunos de doutorado confrontem diretamente a frágil realidade do mercado de trabalho acadêmico e se planejem de acordo. Incertezas sobre o futuro podem ser um preço que os alunos tenham que pagar, mas eles têm menos chances de sofrer se as suas identidades não estiverem inteiramente ligadas à pós-graduação.
“Se você quer ser professor universitário, pense como a vida poderia ser se isso não acontecesse”, aconselha Linda. “O que mais poderia te fazer feliz? Almeje um balanço na vida, em que um mundo enriquecido por família, amigos e hobbies deem a sensação de completude que o trabalho pode não dar”. No meu caso, a terapia me ajudou a sobreviver e terminar o doutoradoe a planejar minha vida fora da academia antes mesmo de eu ter terminado a tese. Eu decidi me tornar uma escritora. Hoje em dia, eu raramente uso meu conhecimento em física. Mas ainda confio na força interior que desenvolvi durante meu tempo na pós-graduação, que me deu coragem para moldar minha própria vida.
* Os nomes foram trocados para preservar a privacidade dos entrevistados.
Original aqui

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