quinta-feira, 8 de agosto de 2019

"Poema de amor" - Pablo Neruda

Ver a imagem de origem













Poema de amor

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Escrever, por exemplo: “A noite está estrelada”,
e tiritam, azuis, os astros, à distância".
O vento da noite gira no céu e canta.
Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Eu a quis e às vezes ela também me quis.
Nas noites como esta a tive entre meus braços.
Beijei-a tantas vezes sob este céu infinito.
Ela me quis, às vezes eu também a queria.
Como deixar de amar seus grandes olhos fixos?
Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Pensar que não a tenho. Sentir que a perdi.
Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela.
E o verso cai na alma como no pasto o rocio.
Que importa que meu amor não pudesse guardá-la.
A noite está estrelada e ela não está comigo.
Isso é tudo. À distância, alguém canta. À distância.
Minha alma não se conforma com havê-la perdido.
Como para encontrá-la meu olhar a procura.
Meu coração a procura e ela não está comigo.
A mesma noite que faz brancas as mesmas árvores.
E nós, os de então, já não somos os mesmos.
Já não a quero, é certo, porém quanto a quis.
Minha voz buscava o vento para tocar seu ouvido.
De outro. Será de outro. Como antes de meus beijos.
Sua voz, seu corpo claro. Seus olhos infinitos.
Já não a quero, é certo, porém talvez a queira.
É tão curto o amor e tão grande o esquecimento.
Porque em noites como esta a tive entre meus braços,
minha alma não se conforma com havê-la perdido.
Ainda que seja esta a última dor que ela me causa
e estes os últimos versos que lhe tenha escrito. 

Pablo Neruda


0 comentários:

  © Blogger template 'Solitude' by Ourblogtemplates.com 2008

Back to TOP